sábado, 9 de março de 2013

ENVOLVIMENTOS E A TRAMA CRIADA POR MARIA ADAIR - 3 DE NOVEMBRO DE 1986


JORNAL A TARDE, SALVADOR,  SEGUNDA-FEIRA, 3 DE NOVEMBRO DE 1986

ENVOLVIMENTOS E A TRAMA CRIADA POR MARIA ADAIR

Observem as tramas que ela constrói com maestria
Uma grande trama sempre envolveu a vida quixotesca desta mulher, aparentemente frágil, mas, que tem dentro de si uma força muito forte. Ela explode em energia e precisa de muitos grandes espaços para dar vazão a seu impulso criativo. Quase sempre está inventando coisas, dentro de sua própria casa, cortando, emendando,aumentando e até promovendo exposições de seus alunos, dando-lhes as primeiras orientações a caminho da profissionalização. Por isto tudo não poderia ter escolhido nome melhor, mas adaptado a seu próprio eu, para denominar esta sua exposição que foi aberta na última quinta-feira na Época Galeria de Arte de A Grande Trama.
Evidente, que as pessoas que acompanham o movimento de arte já devem a esta altura ter identificado esta personagem cheia de força e criatividade. Mas, para os iniciantes informo que trata-se de Maria Adair. Ela vive com os pés no caminho, pronta a dar um passo adiante ou mesmo alçar voo, se preciso for. Ação é uma palavra presente na sua arte que se multiplica em formas abstratas retas ou sinuosas colorindo a nossa existência. Ação, também na presença da pintura que ás vezes se acomoda na superfície da tela ou do papel, mas que também invade uma parede. Ganha o espaço real para cobrir o corpo, vestir a madeira, envolver o ferro e poder ser vista em todas as dimensões e por todas as dimensões e por todas as direções, ganhando forma nova em cada ângulo de visão. Diz Maria Adair.
Nos revela ainda que são 10 anos de trabalho árduo. O registro de parte de uma vida dedicada á arte, tanto na produção, como no ato incontido do magistério, observando e orientando os novos talentos que surgem e vão crescendo no dia-a-dia do fazer.
Sua arte é o próprio registro de uma trama viva que vai construindo situações entrelaçadas e multicoloridas permitindo uma leitura suave. É uma linguagem trançada por linhas que funcionam como verdadeiros signos, cada uma com um significado, que varia na medida e ao gosto do espectador.
Ao olhar uma tela de Adair a gente sente necessidade de acompanhar os caminhos, ás vezes difíceis, seguidos por cada uma linha até o seu final.
Outras somem na trama armada pela artista que parece brincar ou querer testar a nossa sensibilidade.
E chego ao ninguém sozinho. Auto-suficiente nada exatamente ai é que é preciso ter cuidado! Estas duas frases inseridas pela artista no catálogo me deixaram pensando sobre o perigo da individualidade, do superego e da auto-suficiência. Um perigo que não ronda apenas Maria Adair, mais muitos outros artistas alguns até iniciando, na difícil tarefa de ser artista.

É preciso uma interação maior e também uma abertura para receber de outras pessoas de fora as informações, as criticas e observações sobre o trabalho. Isto é importante porque é o resultado, o consumo. Quando escrevo um artigo no jornal preocupo-me como o meu público vai recebê-lo.
Obra recente de Adair. Ela pinta tudo!
Quero saber as reações para que possa corrigir os meus erros, procuro e consigo corrigi-los e não repeti-los, porque são prejudiciais a mim próprio.
A cadeira vira objeto
de Arte em suas mãos
Pode parecer despropósito este parágrafo acima. Mas, não é. Ao contrário, serve para que as pessoas, inclusive a artista Maria Adair, façam uma pequena reflexão, uma pequena parada sobre suas próprias ações.
Voltando a sua arte, vejo a presença das gametas de madeira, tão úteis nas casas ou lares humildes do interior do estado. Inicialmente, Maria Adair as utilizou como suporte, sem interferir na sua forma. Pendurou, alinhou e finalmente, agora recortou algumas e as envolveu com treliças coloridas! O fundo verde da vegetação contribuiu para dar-lhes maior grandeza e eis que estes objetos transmutados ganham força plástica espetacular. Até uma velha cadeira foi envolvida nesta trama plástica, assumindo também status de nobreza no mundo plástico-lúdico de Maria Adair.

     ATÉ SARNEY TIRA UMA DE ARTISTA

A 1º Exposição de Artes Plásticas e Literatura dos funcionários do Planalto conseguiu reunir pela primeira vez numa mostra pública quadros a óleo do presidente José Sarney, que, além da poesia, dedica parte de seu tempo de lazer para a pintura. Isto para mim é uma terapia ocupacional - explicou o presidente ao fazer uma visita de surpresa à exposição e olhar atentamente os quadros de antigos funcionários da casa.
O ministro-chefe do SNI, general Ivan de Souza Mendes, disse que é uma forma dele descarregar as tensões diárias do importante cargo que ocupa.

    FASCÍNIO DOS TRENS DE COSTA LIMA

O artista Costa Lima e um dos seus trens que causam saudades
Os que não o conhecem de perto estranharam o seu fascínio pelas velhas marias- fumaças que rompiam os prados e as planícies bufando e trazendo alegria ás pequenas localidades. O apito característico que expele fumaça chamando sempre a atenção da garotada que corre para a estação para saber das novidades. E, os vendedores de balinhas, frutas e de outras guloseimas correm apressados para vendê-las. Minutos depois partem a Maria Fumaça deixando algumas pessoas e levando outras e também mercadorias. Em algumas localidades, por longos anos, a estrada de ferro foi a própria redenção, a única ligação com a civilização. Infelizmente, os governos que se sucederam nestes últimos anos, deixaram que as nossas estradas de ferro de Nazaré, e a própria Leste Brasileiro. Trem no Brasil é coisa do passado, ou serve apenas para carregar minérios e outras mercadorias.
Depois de dar este mergulho no tempo e passar por cima desta magia que é o trem, vamos para na estação onde repousam os quadros de Costa Lima. Um artista que divide o seu amor entre o mar e o trem. Pinta belas marinhas, mas o seu forte é o trem. É mesmo um apaixonado por trens. Para onde vai leva consigo um trem. Pode ser numa tela ou mesmo miniaturas de trens que manda vir de todas as partes. Sua casa é um grande pátio onde várias locomotivas se cruzam, descem e sobem ladeiras, vencem túneis e pontes, param em estações, e prosseguem com aquele barulho característico das pesadas rodas de ferro correndo celebres pelos trilhos. Ele comanda tudo. Como uma criança acompanha cada lance e vibra quando todo aquele mecanismo funciona bem.
Evidente que sendo um artista não poderia ficar restrito aos trenzinhos instalados num dos cômodos de sua casa, e nem tampouco ao saudosismo daquelas imagens de infância.
Usando a tela como suporte, Costa Lima vai dando forma aquela atmosfera dos sertões e surgem os trens e agente sente quase aquele cheiro de madeira verde queimando e ouve o barulho do seu apito recheado de alegria.
E as Marias-Fumaça vão trilhando os espaços branco das telas envolvendo todos aqueles que se apressam a observá-los. Algumas delas estão reunidas na Galeria Nogueirol, que fica numa das salas do prédio do Salvador Praia Hotel, em Ondina. Portanto, os aficionados por trens ou mesmo que gostam de ferromodelismo procurem conhecer Costa Lima, que lhe proporcionará momentos de alegria.

JADIR FREIRE VEIO MOSTRAR SUAS FANTASIAS COLORIDAS

Jadir Freire é baiano, mas vive e trabalha no Rio de Janeiro. Dia 4 de novembro, pela primeira vez na Bahia, realiza uma individual no Escritório de Arte, apresentando suas pinturas recentes.
Sobre o seu trabalho, Calasans Neto escreveu: Dê um mergulho profundo no inconsciente do sonho, formando um jogo perene de cores vivas, saídas de um caleidoscópio fixo, é a formula que Jadir Freire executa com maestria o início de seu trabalho. Depois aplica toda a sua força criadora num detalhamento consciente entre a cor e o desenho, juntando as peças básicas da sua fantasia. São falecias que se assemelham ás grandes paredes cortadas longitudinalmente, impregnadas de areias coloridas. Tão vistas neste Brasil seco do Nordeste.

Jadir Freire não as usa como decoração imediata e sim como uma verdadeira navegação do universo que é dele, onde o pincel é o astrolábio e a brancura da tela seu mapa e seu guia.Sua trajetória é perfeita e limpa. Cada acaso é um encontro feliz e as suas realidades vão surgindo e sendo estocadas para o mundo de aventuras em descobrir rotas inexistentes. As mãos de Jadir Freire comandam sua viagem ao imponderável mundo do não existir e a fantasia é o sonho maior. Ele vai seguindo, desvendando a si próprio neste labirinto onde a objetividade é um sentimento ou mera peça decorativa. O que importa é o seu final, e este Jadir sabe fechar e dar aquela pincelada que define o começo de um outro trabalho, mais versátil, mais maduro, numa seqüência gradativa do seu amadurecimento. O seu sonho não é perdido ao acordar e sim, atropelado e lembrado nesta avalanche de cores e de formas que é o seu jeito de falar e de ser amado.
Tendo participado da V Bienal de Cali, Colômbia, este ano, Jadir esteve ainda no Salão Nacional de Artes Plásticas, Projeto Arco-Íris, 30 Anos de Arte no Brasil, Desenho brasileiro Contemporâneo na cidade do México e em Bogotá 1984, IV Salão Brasileiro de Arte, VII Exposição de Arte Brasil- Japão em Tóquio, III Salão Paulista, sendo integrante da exposição Como Vai Você, Geração 80? No Parque Laje, Rio.

   DOZE TELAS DE CÍCERO DIAS NA GALERIA PANCETTI
Uma bela obra de Cícero para ilustrar este texto

De qualquer modo, Cícero Dias é um poeta e os poetas quase sempre acertam mais que os outros mortais, escreveu Antônio Bento sobre este pernambucano que há anos reside na França. Doze pinturas do artista estão expostas na Galeria Pancetti e em todas as obras está registrada a marca de sua gente nordestina. O mar como fundo, e no primeiro plano as figuras com os olhos contemplando todas aquelas pessoas que se dispõem a observá-las. São olhares parados no tempo, mesmo naquelas figuras que estão abraçadas a uma palmeira tentando tirar um fruto ou mesmo as que descansam sobre um tronco de uma árvore.
O mestre Cícero Dias é enaltecido por críticos, tanto daqui como na Europa, e já se vão quase 60 anos de pintura. Ele começou em 1925 quando entrou para a Escola de Belas Artes no Rio de Janeiro e dois anos depois já figurava entre aqueles que integravam o Movimento Modernista. Fez vários murais em Recife, e seu conterrâneo Gilberto Freire escreveu, em 1976, que a pintura de Cícero Dias é importante para a fixação da memória brasileira, através da descoberta de cores e de formas características de passados nacionais através dos regionais. Dos coletivos através dos individuais. No caso de Cícero, através principalmente do passado pernambucano, da paisagem de Pernambuco, dos sobrados de Recife.

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