sábado, 16 de fevereiro de 2013

JOSÉ MARIA RECEBE UMA JUSTA HOMENAGEM COM RETROSPECTIVA - 5 DE SETEMBRO DE 1988


JORNAL A TARDE, SALVADOR,  SEGUNDA-FEIRA, 5 DE SETEMBRO DE 1988

JOSÉ MARIA DE SOUZA RECEBE UMA JUSTA HOMENAGEM 
O artista José Maria De Souza
COM RETROSPECTIVA

Uma justa homenagem será prestada pela Anarte Galeria do artista José Maria De Souza com uma exposição retrospectiva, de 15 a 25 de setembro, organizada por July e Maria da Graça Coelho, sem fins comerciais, inclusive a grande maioria dos quadros pertence a colecionadores, artistas e amigos deste grande artista que faleceu em setembro de 1985, aos 50 anos de idade. O catálogo da exposição está primoroso e foi financiado pelo industrial Bank Chase com textos de Juarez Paraíso, deste colunista, Clarival Prado Valadares, Mário Cravo, Calasans Neto, Fernando Coelho, José Roberto Teixeira Leite e Pedro H. Lobianco. São depoimentos de pessoas que conviveram com o artista e essa exposição é um conjunto de obras de diversas fases de sua carreira. Transcrevo um pequeno trecho do depoimento de Juarez Paraíso que foi seu amigo e incentivador na época em que ele frequentou a Escola de Belas-Artes.

Uma gravura de 1961
 Para os amigos e artistas de sua geração, José Maria é sobretudo o gravador. E isto porque, carismático e convicto, surgiu entre nós com uma extraordinária vocação para a gravura. Quando ingressou na Escola de Belas Artes da Bahia, recomendado por Sante Scaldaferri, tínhamos imaginado para o iniciante o mesmo percurso árduo e interrogativo a que se submetem os neófitos das artes plásticas. Depois do desenho foi imediatamente seduzido pelo exercício da gravura, naquela época (1959) um dos mais importantes em nossa escola. Trabalhando precariamente, apenas com lâmina de barbear e tocos de facas, José Maria surpreendeu-nos pela notável colocação dos pesos visuais, pela riqueza textural dos cinzas, e, acima de tudo, pelo conteúdo, expressivo de suas primeiras figuras e naturezas-mortas.
Em que pese a orientação e o estímulo dos amigos, artistas e professores, José Maria, no seu período de formação técnica, foi um autodidata. Confundindo-se com os próprios materiais, sempre encontrávamos o artista fascinantemente preso ao compensado, ás goivas e formões, descobrindo, por amor ao trabalho e por compulsão orgânica, os segredos e o domínio da técnica e da forma que, melhor exprimiriam as suas idéias, o seu sentimento. Enquanto a cidade dormia no silêncio das longas noite, a cena era inconfundível: José Maria  predestinado, apaixonadamente dedicado ao trabalho artístico, vencendo dificuldades, como um verdadeiro asceta, milagre da própria dignidade e do destino espiritual do homem, ausente as seduções, aos lucros materiais de tantas outras atividades.
Perto de sua morte José Maria pintou  canaviais
O extraordinário seria sondar e revelar a mente de homens desse tipo, perscrutar os motivos, as razões e as emoções que provocam o ato de beatitude, a sua indiferença aos valores temporais, a força irrefreável com que constroem para os demais.
A seguir o pequeno texto que fiz sobre José Maria de Souza tentava montar suas aptidões artísticas. Quando trabalhava como balconista numa casa de tecidos na zona do Comércio, de propriedade do pai do engenheiro Mário Antônio Sampaio, que naquela época era vizinho do artista Sante Scaldaferri, sensibilizado com os pendores artísticos de José Maria, o engenheiro levou-o á presença de Sante, oportunidade em que lhe foram mostrados vários desenhos. Sante observou-os e fez algumas recomendações.
Dias depois nova leva de desenhos chegou para Sante examinar e, para sua surpresa, o então balconista tinha captado todas as informações que lhe foram passadas. Daí nasceu uma amizade, na verdade são muito sólida(se viram poucas vezes) mas sincera.
Sante apresentou-a a Juarez Paraíso e juntos trabalharam algum tempo, até em finais de semana.
O temperamento era introspectivo, arredio até. Outras vezes surpreendia, defendendo um ponto de vista.
Outra bela gravura de José Maria
Essas lembranças são necessárias para que as gerações futuras possam entender um pouco do homem José Maria. Conheci-o numa casa que Renot possuía nas imediações de Patamares. Era um atelier que o galerista arranjou para ele passar uma temporada: lembro-me de belas telas inspiradas nos canaviais pernambucanos, com o branco das casinhas caiadas contrastando com o verde-cana que dominava os campos. Nunca mais o vi, até que fui surpreendido com a notícia da sua morte em 16 de setembro de 1985.
Seu sepultamento ocorreu em Valença, sua terra natal. Ele participou de salões no Rio de Janeiro, da Bienal de São Paulo e fez algumas exposições em várias capitais e também em Buenos Aires.Sua obra foi muita apreciada, principalmente no Rio de Janeiro e aqui na Bahia.
Fez muitas gravuras, onde podemos sentir a influência de Goeldi. No início de sua carreira utilizava lâminas de barbear e tocos de faca para entalhar a madeira. Tenho uma gravura de sua autoria onde a influência de Goeldi pode ser notada. Isso não desmerece a sua obra. Ao contrário, todo artista sofre influências dos mestres e José Maria soube ser ele mesmo.

VAULUIZO FAZ LEITURA CRÍTICA DA SOCIEDADE OCIDENTAL CONSUMISTA
Vauluizo ao lado da tela onde aparece o legendário Jesse James
O Sergipano Vauluízo Bezerra está expondo na Galeria O Cavalete 16 telas a óleo sobre tela e alguns desenhos onde faz um verdadeiro passeio sobre a cultura ocidental. As heranças deixadas por nossos antepassados servem de motivação para o artista que  espontaneamente resgata alguns elementos e os veste com uma roupagem de modernidade. Ele diz conjugar seus aspectos psicológicos com o condicionamento do homem dentro da sua própria realidade histórica. Neste momento, despontam as suas neuroses e todas as informações que dispõe para a elaboração deste seu trabalho que nos lembra o famoso Túnel do Tempoque tantos anos foi uma marca da televisão, onde os abres sempre estavam em contato com pessoas de tempos passados. Só que aqui, Vauluízo dá um tratamento diferenciado, porque veste seus personagens com elementos de hoje para enfrentar esta nossa realidade.
Umas das telas a que ilustra seu catálogo o artista intitulou de Duas Mulheres Passeando Sobre o Empire State, onde podemos ver o famoso prédio nova-iorquino deitado e as mulheres em formas que lembram a Pantera Cor-de-Rosa da televisão, andam graciosamente por cima do velho edifício. Certamente o artista mistura um pouco de ironia com um toque de humor. Uma crítica á sociedade que busca megalomanias para sustentar ou justificar a sede do poder ou de buscar o irrealizável.
Noutro trabalho intitulado Jesse James e os Capangas ele resgata da história em quadrinhos ou mesmo da filmografia a figura legendária de Jesse James, que era uma espécie de Robin Wood do oeste americano, numa alusão à própria expressividade da vida. São segmentos que o artista gosta de trabalhar.
O próprio Forte de São Marcelo e o Elevador Lacerda surgem em suas obras numa tentativa de recuperar a paisagem baiana, retirando-a do cartão-postal, chato e repetitivo. Também, a capital paulista é utilizada como pano de fundo, denunciando a sua descaracterização, só que surge subvertida de sua própria forma, como estivessem todos esses elementos retorcidos, em posições diferentes da normal ou tradicional. Nem mesmo as carrancas do São Francisco escaparam de seu questionamento. À primeira vista enxergamos uma postura radicalizada de Vauluízio. Mas não é.
Simplesmente o artista quer participar do que está feito ou sendo feito, e assim retoma os elementos e os utiliza da forma que lhe convém dentro do seu ponto de vista estético.

RECRIANDO IZA ESBANJA TALENTO
Reproduções de suas jóias criativas

Sou um saudosista quando lembro de objetos trabalhados com muito esmero, carinho até. Feitos por pessoas que levaram anos e anos para aprenderem um ofício e o transmitam às gerações futuras.
Veio a industrialização e os objetos passaram a ser feitos em série, sem aquele toque de qualidade e de sentimento humano. Tudo mecanicamente. Agora, para minha satisfação encontro uma pessoa que também comunga este mesmo sentimento. Iza Guimarães. Uma verdadeira artesã no sentido mais nobre que esta palavra possa conter. E não conformada com a destruição inescrupulosa de objetos antigos feitos em prata ela está à procura deles, até mesmo dos tidos como imprestáveis, quebrados, que são vendidos nesses locais que compram prata para revender depois, evidente de fundir a peça imprestável. Antes disso Iza procura adquiri-los e daí parte para sua recriação.
A artista é uma das melhores joalherias deste País.Vejamos o que ela diz sobre esta sua nova fase cujas peças estarão expostas a partir do dia 14 das 15 às 18 horas no Museu Carlos Costa Pinto, no Corredor da Vitória.
“Os mestres-ourives portugueses nos deixaram um legado de  inestimável valor. Criaram peças do serviço eclesiástico e do serviço profano, primorosamente trabalhadas em técnicas que ainda hoje utilizamos. A destruição dessas peças com a intenção de reaproveitamento do material. O meu gosto por nossas raízes barrocas fizeram com que me interessasse pelo assunto.
Como parte de uma pesquisa ainda em elaboração, e paralela a uma linha de trabalho contemporâneo, construí jóias partindo de fragmentos de peças utilitárias que consegui salvar da destruição. Respeitei porém, o trabalho dos lusos responsáveis pela formação os nossos primeiros ourives. Recriei, procurando emprestar á peça antiga, um caráter de modernidade, respeitando a técnica e o desenho do meu predecessor.Busquei sobretudo o contraste entre o antigo e o contemporâneo, evidenciando o trabalho de uma época que foi tão rica e tão importante."






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