segunda-feira, 14 de março de 2022

ALMANDRADE EXPÕE EM SÃO PAULO E LANÇA LIVRO

Foto 1.Sobrecapa e capa do livro
Foto 2. Projetos de esculturas.
O artista baiano Almandrade o maior expoente da arte conceitual e construtivista na Bahia estará expondo  a partir do dia 16 até o dia 20, a Oca, no Parque Ibirabuera, em São Paulo, juntamente com Montez Magno, que é  de Timbaúba, em Pernambuco, e está com 88 anos de idade. Também serão expostas obras de  Sérvulo Esmeraldo, cearense, falecido em  2017. O nome da exposição é Geometria Sensível. A mostra foi organizada pela Acervo Galeria de Arte, de Salvador, que reuniu obras desses três artistas nordestinos unidos pela geometria, precisão e a lógica . São trabalhos concebidos dentro de um rigor conceitual, mas que trazem no seu conjunto forte dose de sensibilidade, poesia e criatividade.

A curadora Denise Mattar na sua apresentação afirma que "o conjunto deixa nítido o quanto a produção artística abstrata do Nordeste se reveste de características particulares, mais próximas da produção latino-americana, da chamada geometria sensível de artistas como Torres-Garcia Carmelo Arden Quin ou Jesus Soto, do que o concretismo europeu de Theo van Doesburg ou Max Bill. São muitas as razões históricas e culturais que levaram a este resultado".

Voltando para o Almandrade, batizado como Antônio Luiz Morais de Andrade, arquiteto, polêmico, artista plástico e mestre em desenho urbano, professor de Teoria da Arte, é natural de São Felipe, interior da Bahia onde nasceu em 1953. Tem ainda dois projetos de livros em andamento. Um pela Fundação Getúlio Vargas  que seria publicado através de recursos provenientes da Lei Rouanet, e outro aqui na Bahia sob a coordenação da Marco Peltier com patrocinador baiano. Mas, ele não tem ideia de quando esses livros poderão ser publicados. Por isto, que ele fez este dos 50 Anos de Arte e classificou como Volume I.

Desde a década de 1970 que  vinha produzindo uma obra completamente distanciada da grande maioria dos artistas baianos que se apresentava através de outras formas como o figurativo e o expressionismo. Os seus trabalhos ao serem observados mostram o rigor do desenho e a sutileza dos traços e espaços deixando claro que por trás está um arquiteto conscio deste jogo permeado de sensibilidade. São obras que exigem do espectador um olhar mais sutil,mais demorado para que possa deixar penetrar as imagens a serem decodificadas de acordo com as informações que cada um dispõe.Neste livro estão inseridos vários textos, inclusive este de minha autoria que transcrevo:

"Almandrade

Obra O Horizonte do Quarto, acrílica sobre tela, de 1990
Venho acompanhando a sua trajetória há alguns anos. Ele começou figurativo e num processo gradual
de somar informações desaguou na arte conceitual. Evidente que sua formação de arquiteto contribuiu para isto de forma definitiva .Nos anos 70 Almandrade já mostrava suas obras, numa Salvador ainda distante de absorver este tipo de arte. Agora ele retorna à pintura com esta mosta, revelando que isto ocorre desde a metade dos anos 90, defendendo que as possibilidades da pintura ainda não se esgotaram. Fiquei feliz em reencontrar um Almandrade cada vez mais reflexivo e flexível. A chegada dos anos vai nos pondo com o olhar mas generoso mais crítico é verdade, porém, disposto a dialogar , e notar que as diferenças existem e que elas andam e vivem fora de nosso mundo ou dos nossos traços e círculos .O que não podemos abrir mão é da nossa capacidade crítica e de reflexão. Ninguém é proprietário da verdade. Ninguém deve ser condenado por pintar de um jeito ou de outro. Cada um deve se expressar como entender que deve, cabendo ao marchand, ao colecionador ao crítico e ao próprio mercado prover e enaltecer com seus instrumentos a produção de arte. 

Àqueles que mesmo com talento, ficarem ou estejam momentaneamente fora do mercado, certamente um dia serão reconhecidos e colocados nos seus devidos lugares. Esta é a marcha da vida, esta é a dinâmica que norteia todas as profissões. Relendo um texto escrito por Almandrade no ano 2000 onde ele defende : "A independência da obra de arte com relação ao repertório de um público principalmente, criou uma expectativa em torno de sua leitura. Hoje em dia, o artista é solicitado a prestar esclarecimentos sobre o significado de sua obra, como se fosse possível alguma tradução verbal". Acredito que isto acontece quando o observador não tem informações que lhes assegurem a compreensão da obra de arte. Como estamos num país de pouca leitura, onde a obra de arte ainda é muito limitada a museus, exposições e colecionadores abastados é evidente que existe uma dificuldade quase generalizada, principalmente se você não produz uma arte figurativa de fácil entendimento. A decodificação depende de cada um de nós. Se fizermos um exercício mandando algumas pessoas lerem um conto, e em seguida solicitarmos que revelem suas interpretações sobre o texto lido vamos ter surpresas agradáveis. E, isto é compreensível e importante pela capacidade de cada uma das pessoas de absorverem e decodificarem ou não as informações ali contidas. É por esta razão que na juventude Almandrade ficava inquieto com a falta de compreensão do público com suas obras.

Obra Poema-Objeto, acrílica sobre madeira, 1973
Almandrade possui uma formação intelectual acima da  maioria dos artistas baianos, e isto contribui ainda hoje para
aguçar suas inquietações. Ele tem posição firme contra a  ditadura do mercado, o que considero compreensível.  Também, discordo das regras do mercado e devemos  continuar lutando contra elas. Porém, o mais importante de  tudo isto é que reecontrei um Almandrade maduro, mais  compreensivo com as coisas da vida, acima de tudo um  artista,  que mesmo enfrentando todas as dificuldades  pessoais  interpostas pelo mercado e pela dificuldade de  compreensão imediata de sua arte, ele prossegue firme  aprimorando a qualidade de sua produção. "

Já o Alexandre Bonfim fez também um texto que  Almandrade inseriu no livro com o título sobre a poesia do  artista: "Os malabarismos de uma consciência intensamente  lírica" que diz :"A poesia de Almandrade faz-se, antes de  tudo,  daqueles temas essenciais da condição humana, tão  preciosos para os homens do nosso tempo, distanciados da  razão de existir. Uma perplexidade em constante estado de  nascimento acorda, aos olhos do leitor, uma realidade múltipla e absurdo. Ao lermos os textos do poeta baiano, deparamo-nos com a densidade real e com todos os seus limites e frustrações:"cidade perplexa / embalagem hostil / inútil divertimento". O eu lírico dos poemas de Almandrade gasta-se nas arestas do mundo, rasga-se nos ângulos dessa realidade limitada, em um viver de raríssimas possibilidades de salvação ou transcedência  ( encontradas, como veremos a seguir, apenas no erotismo e na epifania da palavra lírica): "o andarilho inocente / repete o caminho / sem encontrar / uma saída". Esse esgotamento das possibilidades do real lembra-nos dos angustiosos labirintos kafkianos, em que todas as direções nos encaminham , na verdade, para lugar nenhum. O mesmo clima de abafamento, de aprisionamento, entrevisto na ficção de Kafka, pode ser percebido nesses poemas de agudeza existencial. Drummondiano, sem deixar de possuir sua voz própria e peculiar, Almandrade recria , portanto, aquele clima claustrofóbico da poesia do autor itabirano, tão bem expresso pela persona inventada por Drummond, ou seja , o seu famoso José".

                                        TRAJETÓRIA

Obra Poema Visual em nanquim - 21x30cm, de 2013.
 Conta no livro Almandrade que deu início ao seu trabalho   entre a literatura e as artes visuais em 1972 ainda no colégio   quando participou de um salão estudantil. A poesia veio   primeiro e em seguida se interessou pelas artes plásticas.   Através da poesia concreta chegou ao concretismo e depois   à  arte conceitual movimento que teve seu auge na década   de  1970. A partir de então passou a utilizar vários suportes   para se expressar como o desenho, pintura, escultura,   instalação, poema visual dentro da opção estética . Isto já se   vão 50 anos !

 Diz ainda Almandrade que depois dos primeiros ensaios   figurativos nos anos 1970 e 1971 decidiu pela geometria ,   "desenvolvendo um produto ora pictórico, ora linguístico,   como um lugar de reflexão,solitário,à margem do circuito   baiano. A experi|ência gráfica proveniente do curso de arquitetura foi decisiva na formalização do projeto gráfico no poema e em outros suportes. E finaliza dizendo que "esta publicação é apenas um pequeno recorte que registra o meu compromisso com a linguagem desde os anos 70 ,no silêncio do circuito de arte. Hoje mantenho meu projeto, entre o conceitual, o construtivo e a poesia visual . É sempre a busca do impossível".


 



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