terça-feira, 15 de dezembro de 2020

ALBERTO VALENÇA UM MESTRE DA PINTURA BAIANA


Nunca é demais para se falar e enaltecer um grande artista. Àqueles que nos brindaram com sua sensibilidade e sua arte merecem sempre ser lembrados, e é com muita alegria que vejo a professora Vera Spínola escrever um livro dedicado ao pintor  Alberto Valença, um dos mais respeitados e reconhecidos mestres da pintura baiana. Se vivo estivesse estaria completando 131 anos . Chamado de "O Poeta das Cores" e "Mago dos Acadêmicos Baianos"  Alberto Valença foi discípulo de Manuel Lopes Rodrigues. Introspectivo e exigente no seu ofício foi contemporâneo dos mestres Presciliano Silva e Mendonça Filho.
Ao lado seu autorretrato pintado em 1942 com 48cm x 40cm. Nesta obra tem uma dedicatória dele para seu filho Antônio Alberto Valença como se o autorretrato foi pintado em 1922, mas a data certa é 1942.

Vera Spinola e seu esposo o
Antônio Alberto Valença.
Nasceu na cidade de Alagoinhas em 7 de junho de 1890 e foi batizado com o nome de Alberto de Aguiar Pires Valença . Para escrever o seu livro Conversando com a  Pintura de Alberto Valença - Um Romance Biográfico a professora Vera Spínola percorreu um longo caminho partindo da intimidade de sua casa, onde importantes obras de Alberto Valença estão nas suas paredes presenciando o dia a dia da autora e a convivência como o único filho homem do pintor o economista Antônio Alberto Valença. Portanto, além das suas pesquisas em museus, institutos culturais e fontes bibliográficas ela dispôs  em sua própria casa de uma fonte primária de importância relevante que é o filho do homenageado , seu esposo.

Breviário - Sacristia do Convento de
São Francisco,1929 com 65 x 55 cm
O pintor Alberto Valença era considerado muito meticuloso e consta que mandou queimar em momentos diferentes várias obras que fez e não gostou. Este rigor  carregou por toda a vida e isto talvez tenha influenciado em não ser mais conhecido como deveria entre o grande público. Aos 35 anos de idade ganhou o Prêmio Caminhoá e foi estudar na França na famosa Academia Julian, onde manteve contatos com grandes mestres do impressionismo e do expressionismo francês e de outros países que lá ensinavam e estudavam. Passou uma temporada na cidade de Concarneau, na região da Bretanha, onde pintou a paisagem e também moradores , especialmente pescadores .

 Não era muito chegado a trabalhar em atelier. Gostava de pegar seu material de pintura e se postar diante da natureza para captar a luz e os elementos que compunham determinada paisagem. Muitas vezes voltava no mesmo horário para continuar a sua obra. E, se lá chegasse o tempo estivesse muito diferente do dia anterior ele voltava para casa e retornava ao local no dia seguinte. Gostava de pintar pela manhã e quando o tempo esquentava muito suspendia seu trabalho. 

Retrato d. Ana 
Cerqueira Lima,
de 1932
.
 Quando fazia retratos, pois ele foi um grande retratista, os seus retratados passavam muito tempo posando para que ele pudesse captar toda a expressão. Não gostava de pintar olhando a foto do retratado. Tem um episódio que ocorreu quando ele pintava d. Romana Calmon, , mãe do saudoso jornalista Jorge Calmon . Ela cansou de tanto posar para o pintor. Ai combinaram que ele  terminaria o rosto, e o traje seria  pintado olhando uma fotografia. Dizem que ele não teria ficado confortável com esta opção. 

Em 1925  faz sua segunda exposição individual em Salvador e ganha o prêmio para ir estudar na França, na famosa Academia Julian. No ano seguinte vai para a região da Bretanha , onde , segundo o saudoso professor Clarival do Prado Valadares, realiza inúmeros estudos , manchas e telas , sobretudo em Concarneau, Finistère ,Pont-Aven e outras localidades, entre pinturas ao ar livre e retratos de modelos locais.  Já em 1928 chega a Salvador e retornar suas idas de bonde para pintar as paisagens baianas. Sua produção passa anos depois a ser comercializada através a Galeria Georges Petit, que ficava na Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro. Isto no ano de 1932 quando participa do Salão Nacional de Belas Artes e apresentou um único 

Paisagem Manhã na Praia de Ubarana, Amaralina -
 1920- Acervo Museu Nacional de Belas Artes , R
J
 trabalho o retrato de d. Ana Cerqueira Lima, que era esposa do almirante Cerqueira Lima que construiu os faróis que orientam os navegadores na Baía de Todos os Santos.  Inscreveu este trabalho no segundo prêmio e obteve a premiação Medalha de Prata. Talvez se tivesse inscrito para concorrer ao primeiro prêmio, poderia ter conquistado.Com o falecimento de sua esposa Lectícia aos 34 anos ele fica muito abalado . Porém continuou pintando e foi ensinar na Escola de Belas Artes .Lembra Vera Spinola que em 1949 ele participou do 1º Salão Baiano de Belas Artes quando ganhou a Medalha de Ouro  com a tela Retrato de Dona Ana , neste mesmo salão a pintora Lygia Sampaio foi premiada também. Casou aos 48 anos de idade com Lecticia Machado ,de apenas 28 anos de idade que era sua aluna na Escola de Belas Artes. Aos 55 anos estava viúvo e com um filho o Antônio Alberto Valença , esposo de Vera Spinola, autora do livro que será lançado no Museu de Arte da Bahia, com uma exposição ainda a ser anunciada. Dai em diante assumiu uma postura ainda mais introspectiva, andava sempre com roupas escuras . Tem um segundo relacionamento com a jovem Joana Amélia  nascendo em 1951 Maria Amélia Valença.

Por do sol do convento do Desterro, 1929-1930 - 
Acervo Museu Costa Pinto.
Ele costumava pegar o bonde dos Aflitos,onde morava,  e seguia para a península itapagipana porque gostava de pintar as paisagens, a praia do Bogari e outros locais. Sempre pela manhã . Levava muito tempo para concluir as suas obras, embora  olhando e guardando a distância e o tempo alguns podem chegar a conclusão apressada que foram feitas rapidamente , sem ocupar muito tempo, porque algumas delas não são muito detalhadas. Manchas que se juntam para formar uma obra de alta qualidade. 
Em 1961 , aos 70 anos de idade escolhe o Convento do Carmo, no Centro Histórico de Salvador, como local para pintar. Era uma espécie de refúgio porque a cidade já estava diferente com a presença de moleques nas praias onde ele antes gostava de pintar. Mesmo no interior do convento suas pinturas sempre mostram uma réstia de luz. Valença era um observador atento da luminosidade que embeleza e clareia as belezas das paisagens e casarios nos trópicos.  Nada menos que vinte e sete importantes obras do pintor estão desde 1969 no acervo do Museu Carlos Costa |Pinto, que fica no Corredor da Vitória, em Salvador. Vale a pena aprecia-las. 

Em 1970 já estava com a visão comprometida dificultando sua capacidade de pintar, e foi neste ano que foi organizada uma exposição retrospectiva no Museu de Arte Sacra da Bahia, que fica na Ladeira da Preguiça, com sessenta e uma obras dos acervos de museus e particulares.

Em 1979 Clarival do Prado Valadares já tinha documentado cerca de 200 obras de Alberto Valença, e 

 Obra Cais de Concarneau - Bretanha- França 1927
34cm x 41 cm. Acervo Museu Costa Pinto.
Vera Spínola acredita que chegam perto de umas 500 obras pintadas durante sua existência , porque ele pintou  até os 83 anos de idade, e deixou algumas obras inconclusas devido a dificuldade visual. O esperado livro de Vera Spínola será uma excepcional oportunidade de conhecermos melhor o mestre Antônio Valença não apenas como o pintor de grande talento que foi, mas também sua intimidade, o homem através de depoimentos de pessoas da própria família, especialmente seus dois filhos Antônio e Maria Amélia que conviveram muito com ele e conheceram a sua essência. Vera portanto é uma escritora privilegiada por ter estas fontes primárias e ainda a expertise de pesquisar . Devido a pandemia o livro Conversando com a  Pintura de Alberto Valença - Um Romance Biográfico possivelmente será lançado no Museu de Arte da Bahia em junho do próximo ano, quando o pintor completaria 131 anos de existência. Vamos aguardar .



4 comentários:

  1. Como é bom ter alguém para resgatar a história de artistas da Bahia, e, ainda, um blog que dá espaço a publicações deste teor.
    Parabenizo o pombalense Renivaldo Brito pela lúcida e informativa matéria e desejo-lhe sucesso permabente.
    Antonio Mário Bastos
    tonhodopaiaia.org

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  2. Agradeço ao jornalista Reynivaldo Brito por divulgar a obra de Alberto Valença

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  3. Que beleza de texto , Reynivaldo . Entusiasmado , sensível e muito estimulante para esses novos tempos tão adversos . Um livro importante para as artes plásticas baianas ,trazendo a tona tanto a carreira do mestre Valença quanto aspectos de sua vida pessoal e cotidiana . Um importante acontecimento que ocorre num momento especial para revigorar nossos sentimentos.

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  4. Na condição de filho do pintor Alberto Valença, gostaria de destacar a excelência do seu texto sobre a trajetória pessoal e artística de meu pai. O texto desperta o interesse pelo lançamento do livro de Vera e pela realização da exposição retrospectiva que deverão acontecer em junho de 2021, proporcionando um contato direto das atuais gerações com uma obra que integra o rico patrimônio cultural baiano. Muito obrigado Reynivaldo!

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