JORNAL A TARDE SÁBADO, 03 DE
JANEIRO DE 1976
Esses artistas juntos mostraram
aos baianos vários ângulos da arte e várias técnicas de expressão através dos
seus trabalhos expostos nas mais significativas exposições realizadas aqui.
Tive contato direto com esta
gente, que contribui para aumentar os meus conhecimentos, e também, para
avaliar o desenvolvimento da arte, e ainda, no mercado de arte em Salvador. Por isto,
falo ou relembro ligeiramente estas exposições e seus responsáveis.
Por outro lado, não podemos
deixar de falar sobre o surgimento de novas galerias de arte: a Galeria Sereia,
NO Pelourinho; a Galeria RAG, na Boca do Rio e a Galeria das Portas do Carmo.
Também, perdemos o artista que
muito contribuiu para o desenvolvimento das artes: Euler Pereira Cardoso, que
fundou a Galeria Panorama, escolas de artistas.
FLORIANO TEIXEIRA NA GALERIA
TEMPO
Esta exposição foi realizada nos
últimos dias de dezembro na Galeria Tempo, no Salvador Praia Hotel. Ali estavam
reunidos alguns óleos de Floriano Teixeira.Uma pintura lírica e cheia de
detalhes, que eram descobertos pelos visitantes à medida em que começavam a
olhar os seus quadros.
De longe destacavam-se as figuras
maiores, mas esta era complementada pelas menores, com rico detalhes: Pintor e
ilustrador, Floriano Teixeira vive instalado no bairro do Rio Vermelho criando
estas personagens.
Em quase todos os quadros
expostos notamos a presença de um animal, uma ave e o homem. Todos os espaços
foram devidamente ocupados por esses personagens numa mistura de tons que
deixavam as pessoas admiradas com as tonalidades conseguidas por Floriano. Está
foi sem dúvida uma das mais importantes exposições do ano que passou.
LÍBER FRIDMAN NA POUSADA DO CARMO
Trouxeram de longe o pintor Líber
Friedman e o jogaram sem qualquer publicidade ou preparação na Galeria da
Pousada do Carmo. Na sua vernissage este artista, considerado um dos mais
importantes da América Latina, compareceram poucas pessoas. Por isto muita
gente perdeu de ver a sua obra.
Na década de 40 ele andou pela
Bahia voltando em 1974 para rever amigos e a velha Salvador completamente
modificada, segundo declarou. Seu trabalho é inspirado em rituais, mitos e
costumes do Peru e de outros países latino-americanos.
Suas experiências plásticas com a
cultura pré-colombiana nos proporciona o conhecimento da importância desta
cultura e a sua significação artística.
FERNANDO COELHO E OS PALHAÇOS
O Tocador de Bumbo, de Fernando Coelho |
O homem passou a ser o centro de
sua pintura. Os conflitos e as guerras dos últimos anos marcaram sensivelmente
este criador. Seus quadros mostrados no Unhão, juntos, representavam um livro,
sendo cada quadro um capítulo. Uma verdadeira crônica do cotidiano, onde
tocadores de bumbo, equilibristas e fantoches brincam e choram.
Como o tempo passa e não volta, como o tempo muda o Fernando
está aí para mudar, para amadurecer. Vem passando por uma transformação que só
faz acrescentar a seu trabalho criativo.
Ele explica esta transformação
afirmando que começaram a surgiras primeiras mudanças, reflexo do que aos
poucos também ocorria comigo. Simplesmente uma preocupação maior com a
existência do que o formal. Passei a cuidar das coisas interiores com uma maior
preocupação criativa e uma elaboração mental objetiva.
Eu tinha necessidade de dizer
coisas e mais coisas através dos meus quadros. Fui pintando uma crônica,
fazendo de cada quadro uma folha de um diário.
O Fernando é também um jovem
artista com muita vontade de criar, de fazer e de estar presente. Quem o conhece
gosta de seus papos e de ler as páginas do seu diário.
Quando vi pela primeira vez seus
novos quadros fiquei espantado com a mudança. Ao abrir a exposição apareci por
lá umas três vezes para examiná-los para ler as páginas de seu diário. Cada vez
encontrava novas coisas belas para ler e sentir. Encontrei, por lá, também
pessoas que procuravam encontrar defeitos no traço e na mistura das tintas.
Elas se perderam e terminaram por gostar daquela crônica do cotidiano.
HANSEN BAHIA NO MUSEU DO CARMO
Cinco grandes exposições marcaram
as comemorações dos 60 aos de vida do gravador Hansen Bahia. A primeira foi a
realizada no Museu do Carmo; em Bonn, outra em Frankfurt, ambos na Alemanha, a
quarta, no Palácio Pamphily, na Itália, e a última em São Paulo.
Assim os movimentos, as
expressões, as cenas eróticas de suas gravuras foram mostradas aos baianos nas
seculares paredes dôo convento do Carmo. Tudo mostra a inquietude de Hansen Bahia.
Embora busque tremendamente um lugar calmo para trabalhar e viver, este artista
é antes de tudo um inquieto, um inconformista. É incapaz de permanecer alguns
minutos sentado numa cadeira . Vive eternamente a sua odisséia e quer ser o
próprio Ulisses , que lhe inspirou para fazer um álbum. Quando falei sobre sua
exposição, que foi aberta no dia 19 de abril ele não pensava em deixar Salvador
Vivia com Ilse sua esposa numa
mansão rodeada de coqueiros e amendoeiras nas imediações da praia de Piatã.
Agora ele coloca sua casa à venda e vai partir para morar numa fazenda no
Recôncavo Baiano. Quer fugir segundo conta, da barulheira dos carros e das máquinas e não quer ter
vizinhos. Os vizinhos estão surgindo e ele está saindo. Também conheço o Hansen
há alguns anos quando ele ministrava um curso de gravura no Icba. Cheguei a
matricular-me e ali mantive muitos contatos e conversas com este artista
inquieto.
Hansen mostrou no Museu do Carmo
gravuras que testemunham toda a sua trajetória, desde o lançamento do álbum
Flor de São Miguel até as novas e eróticas gravuras que integram seus livros no
exterior.
Mostrou àquelas gravuras feitas
no Maciel, onde as prostitutas e malandros surgem às portas do casarões com
seus corpos alquebrados e malandros.Hansen recriava assim toda aquela paisagem
prostituída e marginalizada que é tão cantada em verso e prosa e tão triste na
sua realidade.Ali ele passou algum tempo de sua vida e portanto é um dos
indicados para falar sobre o mangue. Hansen mostrou também a Odisséia que viveu
em águas mais mansas e hospitaleiras. Foi sem dúvida uma das principais exposições
que aconteceu em 1974.
ADELSON DO PRADO
Adelson do Prado, de Vitória da
Conquista, expôs na Galeria O Cavalete. Seus quadros estão sendo muito aceitos
no sul do país. Ele explora a flora, a fauna e tipos de rua. Este artista capta
com grande facilidade todo o clima tropical brasileiro. Suas cores, sua magia e
alegria, que normalmente deixamos passar despercebidos. Desde a década de 1960
que conheço Adelson do prado e o trabalho que ele vem realizando , pelo qual
mantenho respeito.É um artista que tem muito a mostrar aos baianos.
JOSÉ PINTO NA POUSADA DO CARMO
Adão e Eva e o Fruto do Pecado |
Como escrevi na época da sua
exposição ele poderia estar fazendo outros tipo de trabalho. No entanto, ele
prefere manter-se fiel às suas origens, as fazendas de cacau, ao roceiro.
LUÍS BRITTO NO TEATRO CASTRO ALVES
A exposição realizada no dia 19 de maio no Teatro Castro Alves trouxe ao seio das artes plásticas baianas o pintor Luís Britto. Um jovem talentoso que inicia a sua carreira onde dezenas de artistas lutam para chegar.
Sua pintura, bem verdade, é
resultado de um trabalho solitário, de um trabalho de pesquisa em busca da cor
e da temática. Conheço de perto este artista . Inicialmente pintava quadros com
influência da pintura européia com os casarios com predominância do verde e do
azul. As paisagens serviam de tema . Hoje o Luís Britto, adulto, amadurecido,
mostrar a Bahia uma pintura nova e acima de tudo cheia de força.
A arte sempre foi uma necessidade
para este artista e ela reflete muita coisa que tem dentro de si. Uma
vitalidade, muitas vezes incompreendida por aqueles que lhes cercam. É
exatamente esta vitalidade que Luís Britto transcende para as suas figuras
caboclas. Corpos agigantados e cabeças pequenas. As mãos calejadas pela enxada,
pela picareta ou mesmo de segurar o laço do boi. Sinto na arte de Luís um
cheiro de mato, de roça, de Brasil. Portanto, uma pintura que não tem nada a
ver com a que ele fazia quando o conheci pintando.
Neste ano que passou foram
revelados alguns talentos. Porém, a meu ver o mais importante e que apresenta
perspectiva de continuar elaborando um
trabalho sério é o Luís Britto. É verdade que ele tem muito a correr, a
corrigir. O traço, a mistura das cores, a maneira de apresentar o tema, mas
isto é um processo de enriquecimento que se consegue pintando. Pintando e
pintando muito sem parar, sem olhar para trás. É uma trajetória artística que
gostaria de seguir, de acompanhar. Este ano de 1976 será certamente um ano de
criação para o Luís.
RAMOS MELO NO HOTEL PRAIAMAR
O Ramos Melo expôs alguns entalhes no Hotel Praiamar. Homens e mulheres surgiram com seus olhos profundos. Ramos é um artista identificado com sua gente. Natural do Rio Grande do Norte ele transportou para a madeira a seca e o sofrimento dos nordestinos. Os animais sofridos, felinos e desconfiados foram trazidos da caatinga , do sertão para a grande cidade nos trabalhos deste artista. Um nordestino que sabe falar e acima de tudo interpretar a sua terra e a sua gente.
Os
50 anos de idade do artista Carlos Bastos foram comemorados com uma
retrospectiva do seu trabalho que representou uma mostra completa de tudo
aquilo que este artista fez. Depois de realizar um levantamento completo de
tudo aquilo que fez de mais representativo, ele abriu a sua exposição no teatro
Castro Alves,conseguindo até transportar grandes painéis que fez para edifícios
particulares e públicos.
Carlos Bastos tem seu nome
ligados às artes plásticas na Bahia, e sua primeira exposição que foi realizada
em 1943, num dos salões da antiga Biblioteca Pública, na Praça Municipal marcou
época. Os acadêmicos não aceitaram sua arte moderna e partiram para cortar de
gilete os seus quadros, alguns dos quais são considerados peças importantes e
valorizados. A própria igreja manifestou-se através de um artigo no jornal da
Arquidiocese . No entanto A Tarde, Diário de Notícias e outros jornais da época
saíram em defesa do jovem que iniciava sua carreira.
Porém, este incidente não
desanimou o então jovem Carlos Bastos e em 1944 juntamente com Genaro de
Carvalho participava do 1º Salão de Arte Americana, dedicada aos artistas
baianos no Icbeu, em
Salvador. Daí passou a integrar um grupo de artista que
tornou-se famoso não apenas na Bahia e no sul do país, como também no exterior.
Tem vários livros publicados com
desenhos seus. Os murais feitos por Carlos Bastos são famosos, como aquele da
Assembléia Legislativa , no Centro Administrativo da Bahia, e do edifício
Martins Catharino e o da Capela do Museu do Parque da Cidade, na Gávea, no Rio
de Janeiro.Uma verdadeira guerra foi movida por pessoas incapazes de
compreender o que seja uma obra de arte.
Por isto seu mural não foi
encoberto de tinta, certamente reaparecerá como uma das grandes peças
artísticas as do país.
JOSÉ GUIMARÃES NO MUSEU DE ARTE
SACRA
A exposição de quadros e desenhos de José Guimarães 1899-1969 – realizada no Museu de Arte Sacra, da Universidade Federal da Bahia, também foi outro grande acontecimento no setor.
Se analisarmos a obra de José
Guimarães poderemos distinguir três fases: Na primeira, as obras de caráter pós
impressionista,pintada sobre a influência da Escola de Belas Artes e notamos a
presença de Presciliano Silva. Na segunda,agrupamos as paisagens, figuras e
naturezas mortas, pintadas na Academia Julian . Na terceira, realizada na Bahia
depois de 1932, notamos sua obra vanguardista, moderna com uma tendência
crescente ao abstracionismo , prescindindo de detalhes, tratando vigorosamente
planos e luzes.
|A exposição de José Guimarães
serviu não apenas para uma reavaliação críticas , como queriam seus
organizadores, mais acima de tudo para mostrar às novas gerações este talento
quase desconhecido.
Também fizeram justiça: é um
homem que ajudou a arte moderna a percorrer seus caminhos hoje tão procurado em
todo o mundo.
Pesquisa Itaú Cultural:
Pesquisa Itaú Cultural:
José Tertuliano Guimarães (Nazaré BA 1899 - Rio de Janeiro RJ 1969). Pintor, gravador,
ilustrador, desenhista. Estuda com Robespierre de Farias e Presciliano Silva, na Escola de Belas Artes da Bahia, em 1929. Nessa instituição recebe o Prêmio Caminhoá, ao concluir o curso Lopes Rodrigues. Com pensão do governo, viaja para Paris e estuda com Albert Laurens na Académie Julian. Recebe o primeiro prêmio de composição desta instituição e é admitido no Salon Officiel des Artistes Français.
Em 1932, de volta a Bahia, realiza uma individual em Salvador. Esta exposição, considerada o marco inicial do modernismo na Bahia, teve crítica favorável,mas não agrada os artistas nem o público. Entre os anos de 1932 e 1939, faz ilustrações em xilogravura para a revista Seiva e Flama. É membro do Partido Comunista Brasileiro. Transfere-se para o Rio de Janeiro, onde retoma seu antigo oficio de pintor de paredes, e torna-se catedrático de Desenho no Colégio Pedro II.
ilustrador, desenhista. Estuda com Robespierre de Farias e Presciliano Silva, na Escola de Belas Artes da Bahia, em 1929. Nessa instituição recebe o Prêmio Caminhoá, ao concluir o curso Lopes Rodrigues. Com pensão do governo, viaja para Paris e estuda com Albert Laurens na Académie Julian. Recebe o primeiro prêmio de composição desta instituição e é admitido no Salon Officiel des Artistes Français.
Em 1932, de volta a Bahia, realiza uma individual em Salvador. Esta exposição, considerada o marco inicial do modernismo na Bahia, teve crítica favorável,mas não agrada os artistas nem o público. Entre os anos de 1932 e 1939, faz ilustrações em xilogravura para a revista Seiva e Flama. É membro do Partido Comunista Brasileiro. Transfere-se para o Rio de Janeiro, onde retoma seu antigo oficio de pintor de paredes, e torna-se catedrático de Desenho no Colégio Pedro II.
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