sábado, 15 de dezembro de 2012

NOSSA ARTE POPULAR É VISTA PELOS ITALIANOS - 08 DE ABRIL DE 1985


JORNAL A TARDE SALVADOR, 08 DE ABRIL DE 1985

NOSSA ARTE POPULAR É VISTA PELOS ITALIANOS

O sergipano Antônio Maia tem sua arte calcada nos ex-votos
Roma (AFP)- uma aquarela em traços simples, em madeira, mostrando em primeiro plano a imagem de uma pessoa tendo ao fundo uma paisagem. Embaixo, uma legenda: “Milagre que o Senhor Bom Jesus fez a um negro que foi mordido por uma cobra”. Trata-se de um ex-voto (em retribuição por uma graça recebida) do século XVIII, encontrado no Nordeste brasileiro e que, juntamente com outras 104 peças semelhantes, estão expostas no Instituto Ítalo- Latino Americano (IILA) de Roma.
Pela primeira vez, os italianos terão oportunidade de apreciar estes objetos da arte popular brasileira, pinturas e esculturas dos séculos XVIII, XIX e XX e que hoje fazem parte de sua arte.
Perdidos até 1938, foram os estudiosos Luís Saia e Mário de Andrade que faziam uma viagem pelo Nordeste para investigar as raízes da música popular, que os “descobriram”, dando início a uma primeira análise de crédito artístico sobre os ex-votos. Uma doença, um acidente, uma operação cirúrgica eram motivos suficientes para pedir, a Deus ou aos Santos, a graça do “milagre”. Em troca, os fiéis encomendavam a pintores ou escultores populares uma mão, um pé, uma cabeça ou coração que representasse graficamente a graça recebida.
Os objetivos eram geralmente em madeira principalmente os que provinham do estado de Minas Gerais, encontrando-se ainda os ex-votos em prata da Bahia, em cera ou em barro, embora este último material com o tempo tenha sido deixado de lado por causa de sua fragilidade.
As pinturas, aquarelas ou óleo sobre madeira ou sobre lâminas de metal, também registradas na arte popular portuguesa, foram a princípio manifestações quase que exclusivas de famílias de maior nível econômico-social. A medida, em que o ex-voto se divulgou e generalizou-se, abrangendo outros setores sociais, a plástica foi sendo abandonada pelos mais abastados.
No Brasil, os ex-votos ainda são encontrados nas igrejas, em recintos dedicados para recebê-los ou “sala dos milagres”, mas também em capelinhas à margem de estradas.
Segundo a tradição, um ex-voto ajuda para que a alma de algum falecido, que continua “rondando” o lugar, chegue, mais facilmente ao “Senhor Bom Jesus”. Muitas vezes, um católico, manda esculpir sua própria cabeça e a coloca dentro da igreja para que esta, a maneira de um “dublê”, assista as funções religiosas em seu lugar.
O fenômeno dos ex-votos, divulgado em vários países da América-Latina, tem raízes nas antigas religiões pagãs. Já na antigüidade, os guerreiros ofereciam suas armas aos deuses, os atletas suas coroas e as mulheres seus cabelos.
Nas mais diversas sociedades e culturas, os ex-votos tiveram expressões diferentes, desde a imolação de animais a outras manifestações incruentas, como a entrega de madeira perfumada, flores, os primeiros frutos.
Apesar de ainda constituírem uma tradição nas regiões rurais, o avanço da tecnologia está destruindo a arte popular.Atualmente, os ex-votos estão sendo substituídos por fotografias ou artigos de plástico.
A maioria das obras apresentada na exposição de Roma, que terminará dia 21 de abril, pertencem ao Museu do Folclore e ao Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro e coleções particulares. Foram, reunidas por Jacquelini Montagu, uma divulgadora da arte latino-americana a nível internacional.
Acompanham a mostra 15 esculturas de Anderson Medeiros, que recebeu vários prêmios no Brasil e no exterior, inspiradas e elaboradas com ex-votos originais. Uma delas, “O repórter”, que reúne 50 pequenos ex-votos, foi premiada pela Bienal de São Paulo em 1974. Juntamente com as esculturas, a exposição compreende oito acrílicos em tela e sete serigrafias de Antônio Maia, também inspiradas nos ex-votos.
A mostra, que será depois apresentada em outras cidades européias e norte-americanas, e completada com a projeção de seus filmes “Padre Cícero”, “Visão de Juazeiro”, “Jubileu”, “Viva Cariri”, “Graças a Deus”, e “Os Messias dos Sertões”, com referência ao significado popular desses ex-votos, que foram, que tendem a desaparecer.

                   TAPEÇARIAS DE ANNETTE KAPLAN

Annette Karplan, artista norte-americana que já realizou exposições em vários países, e com trabalhos incorporados a importantes coleções nos Estados Unidos; Inglaterra; Itália e Brasil, que estará expondo seus trabalhos em tapeçarias no Museu de Arte da Bahia, Av. Sete de Setembro 2340, Palácio da Vitória, a partir do dia 10 de abril, às 21 horas, quando se dará a inauguração, que será precedida de uma palestra da própria artista sobre o seu trabalho, às 20 horas, no auditório do Museu de Arte da Bahia.
Annette Kaplan há 20 anos se dedica à tapeçaria e esta exposição abrange um decênio de sua obra. –Elena Canavier, que assina o catálogo de apresentação, disse que “Annette Kaplan faz parte deste grupo de artistas talentosos e disciplinados que se inspiraram no processamento de um determinado material para criarem obras únicas no seu gênero”.
A exposição que é promovida pela Fundação Cultural do Estado da Bahia- MAB, ACBEU, e USIS, estará aberta até o dia 24 de abril, de terça à domingo das 14 ás 18 horas.
Annette Kaplan se ocupa de tapeçaria há 20 anos, tendo começado a trabalhar em tecelagem em 1965, na Califórnia. Embora em grande parte autodidata, Annette Kaplan foi profundamente influenciada por Trude Guermonprez na sua colocação perante a arte, sua escolha de tapeçaria artística como meio de expressão e o emprego de desenho minimalista nas suas obras. Trude Guermonprez foi membro do grupo Bauhaus tanto na Alemanha como em Chicago, e suas obras refletem o nível altamente profissional deste grupo, as suas conhecidas colocações quanto ao “design” e aos valores funcionalistas.
Annette Kaplan começa uma obra desenhando um cartão com toda a tapeçaria em papel “graf” ou fazendo um desenho em tamanho natural, colorido.
Os desenhos em papel “Graf” são para as obras feitas pelo sistema Jacquard ou Drawloon que produzem obras tecidas duplamente, pelas quais Annette Kaplan é mais conhecida.
Cada linha vertical representa um fio da trama que é levantado por meio de um cartão perfurado (Jacquard) ou de uma lançadeira (Drawloon). Os seus dois teares foram montados segundo os teares do século 19. O desenho completo é programado antes da execução, o que faz desses teares autênticos precursores dos computadores da era moderna.
Funcionado com base nos mesmos princípios que os computadores, o desenho tem componentes verticais e horizontais que são trabalhados linha por linha para criar uma imagem.
Os trabalhos mais antigos de Annette Kaplan foram executados num tear Jacquard. Ela estava muito comprometida naquele tempo com motivos geométricos, desenhos repetitivos e imagens refletidas. Quando ela mudou para o sistema Drawloon, conseguiu maior flexibilidade e formas curvilíneas, assimétricas começaram a aparecer no seu trabalho. As tapeçarias feitas por esses dois sistemas têm uma tecelagem dupla e uma imagem inversa pode vista do outro lado da tapeçaria. Annette Karplan pensa que estas imagens conversas/inversas são os símbolos artísticos do meio ambiente físico e psíquico do homem. Atualmente, ela está desenhando tapeçarias no estilo francês chamado Aubusson. Estas obras recentes são mais representativas e mais coloridas do que os trabalhos anteriores.
Annette Kaplan é uma colorista apreciada, e as cores sutis que ela emprega dão uma dimensão nova e estimulante á sua obra.


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