quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

CRAVO NETO E J. HERRERA VALORIZAM A FOTOGRAFIA - 09 DE DEZEMBRO DE 1985.


JORNAL A TARDE, SALVADOR, 09 DE DEZEMBRO DE 1985.

CRAVO NETO E JOSÉ HERRERA VALORIZAM A FOTOGRAFIA


Um detalhe da paisagem
urbana vista por Herrera
Dois fotógrafos: o baiano, Mário Cravo Neto e o espanhol, José Herrera que se identificam pela sensibilidade de tirar da própria realidade uma atmosfera mágica que enaltece as figuras humanas e os detalhes da arquitetura e das paisagens urbanas e rurais. Mário vai lançar seu novo livro com um pequeno texto de Carybé onde retrata as nossas festas populares e as pessoas que povoam de alegria essas praças. As pessoas que trabalham e também detalhes dos tamboretes, das mesas e das barracas que funcionam cada uma delas como centros irradiadores de alegria e fantasia. É nas barracas que as pessoas comem e bebem fartamente ao pé das igrejas de Nossa Senhora da Conceição da Praia, da Boa Viagem, do Senhor do Bonfim e de muitas outras para em seguida participar tanto dos festejos religiosos como dos profanos. Uma mistura que  Mário Cravo Neto sabe tão bem captar este jeito baiano de conseguir ser alegre o ano inteiro apesar de inflações incontroláveis, de pacotes irreais e de repúblicas novas e velhas que se equivalem pela incompetência e corrupção. O baiano de dezembro a março esquenta este seu ritmo e sai ás praças para mostrar que apesar de tudo ainda há vida, ainda há alegria e acima de tudo antes de qualquer coisa é preciso viver e dançar.
Este ritmo tem sua própria ideologia, suas próprias leis. Cada barra como diz Carybé “já tem seu lugar preestabelecido. É só descê-las, arrumar as mesinhas e bancos do lado de fora e o povo vai se abancando, tomando cerveja e fazendo do tampo da mesa couro e surdo”. Ninguém é capaz de avançar o espaço de outro. As praças estão aí, mas os barraqueiros sabem onde podem armar a sua barraca para animar os festeiros.

Negros, brancos, mulatos e sararás, enfim, uma mistura que só na Bahia a gente vê com tanta nitidez andam e dançam nas praças e Mário com a técnica, que vem desenvolvendo através dos anos, vai documentando este estado de espírito. Cada foto ultrapassa o próprio papel porque nos transmite uma mensagem mágica onde as cores cruas, usada por esta gente simples, parecem contribuir para uma vibração inexplicável sentida por cada pessoa que examina as suas fotos. Seu livro “Os estranhos filhos da casa” é uma pequena mostra desta gente simples e alegre que faz desta Bahia uma cidade gostosa e eterna na sua alegria. Este livro é um poema feito de luz e cor.
Já José Herrera é um viajante que vai fixando momentos com sua objetiva. Momentos que não permitem que você chegue diante de um trabalho dele com idéias preconcebidas. Tudo é surpresa.
Aqui ele representa no próximo dia 11, no Museu de Arte da Bahia, Solar do Unhão, uma mostra composta de três séries de fotografias. A primeira é um estudo sobre a paisagem de Castilla, Espanha, na qual partindo de paisagens clássicas e por eliminação sucessiva de todos os elementos clássicos, procura chegar a forma mais simples de representar os campos. Tudo isto é feito sem perder a essência da própria paisagem. Na segunda série estuda composições sobre temas diversos que vai da abstração ao realismo... Finalmente, na terceira série, seguindo o mesmo ritmo da primeira, ele com malas e bagagens desembarca em várias cidades “tomando-as como tema e as linhas e massas de cor como suporte da composição, até chegar num fundo azul cruzado apenas pela linha cinza de um telahado”.

CHICO DA SILVA MORREU SEM ENTENDER OS HOMENS

Chico da Silva mesmo com sua grande intuição
não entendia os homens e suas atitudes 
Foi enterrado, dia 6, no Cemitério Parque da Paz, em Fortaleza, O corpo do pintor primitivista Chico da Silva, considerado uma das maiores revelações da pintura contemporânea do Ceará. Ele morreu fulminado Por uma trombose, aos 75 anos, após enfrentar vários problemas de saúde, principalmente uma cirrose hepática que o levou várias vezes aos hospitais da cidade. Chico da Silva foi enterrado sem realizar o seu maior sonho, que era a prisão dos muitos falsificadores de seus quadros. Ao Parque da Paz também não compareceram antigos marchands que, no seu auge, o promoviam em troca de cachaça ou troca de cachaça ou pequenas quantias em dinheiro. No Ceará, nos meios artísticos, a estória de um marchand que pegava as telas do artista com cachaça, na década de 60 é uma das mais revoltantes, exatamente pelo fato de, numa entrevista, ele ter contado tudo sobre esse intermediário.
Acreano de nascimento, Chico da Silva foi para o Ceará com oito anos de idade, quando, na então Praia de Iracema, usando cacos de tijolos e pedaços de carvão, desenhava figuras fantásticas, principalmente pássaros e peixes, envolvidos em folhagens.
Descoberto pintando no bairro pobre do Pirambu, em Fortaleza, pelo suíço Jean Pierre Chabloz, Chico da Silva, além de receber todo estímulo, foi promovido junto às mais importantes galerias de artes do mundo. A forma fantástica como pintava monstros pré-históricos e dragões veio depois que ele pintou animais e peixes da fauna amazônica, onde viveu quando criança. Exatamente em função dessa preferência foi que o suíço Chabloz elaborou um livro sobre o artista, na Europa, o que o transformou completamente.

A partir desse livro, Chico da Silva passou a ser visto como um grande artista primitivo em todo o mundo. As suas obras estão espalhadas atualmente por quase todo o mundo, desde os museus da França, Espanha, Itália e Inglaterra até na sala de artes do Vaticano.
Saudades de Chico da Silva que sofreu em vida por ser ingênuo em demasia e não entender a maldade dos homens. Foi espoliado, embriagado, copiado, enfim, comeu “o pão que o diabo amassou”. Seus quadros subiram de preço e depois descambaram na desgraça. Conheci-o durante uma exposição que fez numa galeria que funcionava no Corredor da Vitória e fiquei surpreso com a sua simplicidade, principalmente quando  abriu a boca e arrancou uma dentadura toda em ouro para me mostrar, sem que eu tivesse feito qualquer comentário sobre aquele estranho acessório. Este simples gesto dá para a gente ter uma ideia de como era Chico, um artista simples, que foi enaltecido e depois espoliado.

               A PINTURA DE FRANCISCO FONTES

Ao folhear do catálogo da exposição que o artista Francisco Fontes realiza desde o dia 3, no Hotel da Bahia, fiquei surpreso. Logo na quinta página deparei-me com a reprodução de uma tela intitulada de “Formas I”, onde ele demonstra conhecimento da composição e apresenta movimentos com fortes características de um artista abstrato. Na página seguinte, um interior da Igreja de São Francisco, com um bom jogo de luz e sombra e principalmente, com todo o detalhamento da grandiosidade das paredes douradas daquele majestoso templo. E, vou folheando o catálogo quando encontro uma bela jovem loira nua entre girassóis. Na página seguinte uma paisagem e novamente um templo.
Portanto são abordagens e maneira de ver as coisas de forma bem diferenciadas do ponto de vista pictórico.
Explicando estes contrastes Francisco Fontes disse: “Minha exposição é eclética e coloco as minhas pinturas à apreciação pública consciente de estar oferecendo o melhor que no momento venho produzindo”. Ele expõe 28 telas entre interiores de igrejas, frutas, paisagens e abstratos, além do nu que me referi acima.

                        O RISCO DE MARIA ADAIR

A exposição de Maria Adair na Galeria “O Cavalete” é uma apologia ao risco. Não ao risco inconseqüente, mas ao risco que flui como um verso no papel. Cada risco me faz lembrar caminhos. Sim, caminhos que temos que trilhar neste mundo de incertezas, onde vai a passos firmes andando e principalmente, derramando alegria. Ela chegou ao refinamento do traço onde as linhas curvas compõem  um mundo tão emaranhado quanto as teias de aranha. E, Adair é uma verdadeira aranha que se equilibra entre fios delgados e vai construindo o seu mundo fantástico de cores e espaços.
Ela lança de todos os mecanismos e técnicas, enriquecendo seus trabalhos. “Meu trabalho sempre simbolizou grandes visões de pequenos detalhes da anatomia da natureza, tanto no seu reino animal quanto vegetal ou mineral”. Ela acha importante mostrar estas coisas que muitas vezes passam despercebidas.
O que conduz sua mão e o seu cérebro é a confiança em si mesma e a coragem de arriscar a caminhar nesta trama que forma a sua própria obra.

              UM POEMA-CARTAZ DE SÉRGIO MATTOS

O poema-cartaz Tropeços, do poeta e jornalista Sérgio Mattos, foi lançado na última sexta-feira na Escola de Comunicação, da Universidade Federal da Bahia. O poema foi ilustrado pelo artista plástico Carlos França, que é chargista deste jornal e a produção gráfica ficou por conta da  Jotadáblio Gráfica Editora. O poema foi extraído do novo livro de Sérgio Mattos, Lançados ao Mar, cuja noite de autógrafos acontecerá no próximo dia 19 no Hotel da Bahia. Foram produzidos 1.000 cartazes 40 x 60 em papel couchê de 60 quilos numa produção gráfica de boa qualidade.






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