quinta-feira, 25 de outubro de 2012

GALERIA DO ALUNO COMEMORA UM ANO DE BOM APRENDIZADO - 15 DE JUNHO DE 1987

JORNAL A TARDE , SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 15 DE JUNHO DE 1987

GALERIA DO ALUNO COMEMORA UM ANO DE BOM APRENDIZADO

A galeria do aluno foi criada no ano passado, na Escola de Belas Artes na Universidade Federal da Bahia com alguns objetivos bem definidos, como estimular o aluno a mostrar seu trabalho; ao mesmo tempo, habituá-lo á análise e crítica de sua produção;desenvolver atividades profissionalizantes, dentre outros. Daqui, venho apoiando esta iniciativa, principalmente porque abre espaço para aqueles que estão se iniciando no difícil e tortuoso caminho do mercado de arte.
Ao lado a artista Hedi Lamar tendo ao fundo uma obra de sua autoria,onde aparece todo o erotismo de sua arte.
Só espero que tomem como um incentivo e que os novos expositores não fiquem de uma hora para outra se supervalorizando, como se fossem grandes artistas. Uma simples exposição ou publicação de um texto num jornal, em vez de funcionar como incentivo, pode prejudicar a formação de alguns menos preparados.
Já disse que Maria Adair foi a idealizadora desta galeria. Experiência que viu nos Estados Unidos, onde normalmente as escolas de Belas-Artes ou as academias, como chamam por lá, têm espaço para expor a produção de seus alunos e quase sempre estão promovendo eventos com premiações. Esta galeria já revelou alguns talentos, que daqui pra frente têm muito que trabalhar.
Por outro lado, alguns alunos da Tyler School of Art da Temple University, de Philadelphia, estiveram na Bahia, inclusive a Karen Carpenter realizou uma exposição na Galeria O Cavalete. Ela mostrou a sua versão, a uma visita que fez a uma mina de carvão abandonada, no centro da Pennsylvânia.
Agora a exposição Cambio Change, encerrada na sexta-feira passada, reuniu trabalhos de Clarissa, Cláudia Silvany, Hedi Lamar, Jocelma Barreto e Gabriel Lopes Pontes.
Chamo a atenção para o trabalho de Hedi Lamar, que está nesse instante preocupada com os problemas do mundo feminino, os entraves e preconceitos envolvidos na relação homem-mulher, mulher sociedade e até mesmo com a solidão da mulher. O erotismo de suas obras não agride. Ao contrário mostra exatamente a sua sensibilidade e uma força muito grande, em total contraste com sua pequena estatura. Aliás, ela gosta de trabalhar em grandes espaços e tem explicação para isto. “Procuro fazer trabalhos grandes porque a grande dimensão aliada as idéias claras e diretas produzem um impacto visual forte”.

O DIQUE DO TORORÓ ESTÁ COLORIDO

   Muito trabalho para instalar e colorir o Dique    Uma vista parcial do Dique com os tubos coloridos

Ao sabor dos ventos, tubos coloridos inflados foram estrategicamente unidos formando grandes espaços que variam de acordo com a temperatura e a incidência de luz, se transformando num espetáculo vivo em pleno Dique do Tororó. Este lago, que vem sofrendo no decorrer dos anos um processo de destruição gradativo, foi agora valorizado pelo artista Washington Santana com seu projeto Aquabella. Ele está usando tubos infláveis de polipropileno com 60 centímetros de diâmetro e 11 metros de comprimento, formando um conjunto de dois mil tubos, separados uns dos outros por uma distância mínima de um metro. Todos que estão transitando pela Vasco da Gama são atraídos pelos tubos que se movimentam num vaivém constante.
O projeto de Washington Santana vem sendo buscado há vários meses numa verdadeira peregrinação por indústrias do pólo petroquímico em busca de patrocinadores. Graças a sensibilidade dos executivos Geraldo Araújo, da Polipropileno, Jorge Arthur, da Poliaden, Otávio Pontes, da CPC, e Francisco Pessoa, do Banco Econômico, o seu projeto transformou-se em realidade, dando mais colorido a esta cidade, que agora, mais do que nunca, está necessitando, pois estamos vivendo tempos de incertezas obscuridade. Cito nominalmente estas pessoas porque defendo a importância da participação da iniciativa privada como suporte para a realização de projetos culturais.
Ele pretende levar o seu trabalho a milhares de pessoas, rompendo desta forma as paredes frias das galerias de arte, onde só uma elite tem acesso. Vai instalar dois refletores gigantes para propiciar a iluminação dos objetos e dois pequenos barcos estão a disposição do público para passear por entre os tubos coloridos. Na medida que os barcos se movimentam, haverá uma interferência possibilitando a participação das pessoas na sua obra.
Aos 35 anos de idade, Washington Santana mostra a sua inquietude e sua persistência em ver concretizados os seus projetos. Lembro-me que em 1981 ele permaneceu por 48 horas numa balsa, no mesmo Dique do Tororó, protestando contra a proibição imposta por alguns órgãos públicos municipais de expor alguns trabalhos nas águas do lago.

É um artista inovador, e por esta razão sempre está às voltas com dificuldades. Ele revela uma verdadeira aversão pela temática folclórica, de fácil consumo, e experimenta sempre novos caminhos para sua arte. Seu mais recente desafio de conviver com os miseráveis que vivem dos restos da sociedade de consumo, no mesmo depósito de lixo de Canabrava, procurando subsídios para o seu trabalho, esteve comigo na Redação e uma colega chegou perto dele querendo saber as horas.
Ao lado o artista Wasghinton Santana trabalhando na instalação dos tubos.
Washington olhou para ela e disse:“Este objeto é o anti-horário. Eu não uso relógio”. Ele trazia ao pulso não era um relógio, como a colega pensou e eu também, mas uma tampa velha de Vick Vaporub, preso ao pulso por uma corrente imitando um relógio.
Um atento crítico do sistema, Santana lembra que este final do século está assistindo uma mudança radical no conceito e nas formas de produção, e que a arte deixa de ser uma mensagem de indivíduo para indivíduo, estabelecendo novos padrões de linguagem, ganhando novos espaços e novas dimensões. E Aquabella é um importante passo nesta busca incessante do artista em experiências renovadoras, ousadas tanto na concepção quanto nos objetos que idealiza.



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