Republicado de IstoÉ Independente
Roberto Burle Marx – Brazilian Modernist/ The Jewish Museum, NY/ até 18/9
Paulistano, e “naturalizado” carioca, Roberto Burle Marx atuou desde o final dos anos 20 até sua morte, em 1994. Nesse arco de quase 70 anos de trabalho, desenvolveu uma obra multidisciplinar, “tão variada quanto fascinante”, segundo Jens Hoffman, o curador da grande retrospectiva de sua obra, organizada no The Jewish Museum. Esta é sua segunda exposição individual em Nova York. A primeira foi no MoMA-NY, em 1991, o primeiro solo dedicado a um arquiteto paisagista jamais realizado no museu nova-iorquino. Pintura, escultura, arquitetura, mosaico, cerâmica, gravura, design de joias, figurino de teatro, colecionismo e até culinária estão entre as suas habilidades, evocadas pela nova exposição, que apresenta um criador muito além dos importantes jardins tropicais que o consagraram no Brasil. “Um homem renascentista no século 20”, define o curador.
Ainda assim, o paisagismo é de fato sua marca distintiva. “O brasileiro é indiscutivelmente um dos mais influentes arquitetos paisagistas do século 20”, destaca Hoffman. Ele criou cerca de 2 mil jardins – em parte, nunca realizados – e descobriu cerca de 50 espécies de plantas. Antes de Burle Marx, os jardins brasileiros seguiam o padrão francês, valorizando as simetrias e a flora importada. Ele quebrou a regra, ao se interessar e valorizar a natureza local, nativa da Amazônia, da Mata Atlântica e da caatinga, tida então como “incivilizada”. Ao levantar a bandeira da brasilidade, Burle Marx está para o paisagismo assim como Villa-Lobos está para a música erudita, Tarsila do Amaral para a pintura e a poesia Pau-Brasil de Oswald de Andrade para a literatura.
Embora tenha iniciado a carreira como pintor figurativo, investindo em retratos e naturezas mortas – Burle Marx foi assistente de Portinari no final dos anos 1930 –, a exposição mostra como o criador abraça a abstração como princípio guia de seu design e paisagismo urbano. Com o partido geométrico, Burle Marx pode ser considerado um precursor dos movimentos de abstração geométrica que surgem na Venezuela e no Brasil, como o Concretismo e Neoconcretismo. O artista foi um pioneiro principalmente porque sua geometria desafiava categorias e buscava “o equilíbrio no desequilíbrio”.
Isso se reflete diretamente nos primeiros jardins, desenhados já no início dos anos 1930, sob influência da Bauhaus; em sua primeira obra pública comissionada pelo governo brasileiro, o jardim do edifício do Ministério da Educação e Saúde, no Rio, – um ícone da arquitetura moderna brasileira –, em 1937. Mas se consagra no design de pavimentos de parques e avenidas como o calçadão de Copacabana, hoje o símbolo máximo da cidade.
Acompanhada de uma publicação de 210 páginas, a exposição reúne peças – entre elas a tapeçaria criada em 1969 para a Prefeitura de Santo André (SP) –, esmiúça projetos e atualiza a influência do artista no mundo de hoje, ao apresentar trabalhos de artistas contemporâneos. Integram a mostra a francesa Dominique Gonzalez-Foerster, as brasileiras Paloma Bosquê e Beatriz Milhazes – que mostra no saguão do museu a instalação “Gamboa” (2013), composta por móbiles feitos de flores artificiais – e o compositor Arto Lindsay, autor da paisagem sonora “Butterflies, Molasses” (2016), especialmente composta para a exibição.