quarta-feira, 31 de outubro de 2012

É PRECISO EXPOR OBRAS DE BAIANOS NO SUL DO PAÍS - 19 DE OUTUBRO DE 1987

JORNAL A TARDE SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 19 DE OUTUBRO DE 1987

É PRECISO EXPOR OBRAS DE BAIANOS NO SUL DO PAÍS

É importante o intercâmbio entre artistas baianos e de outros estados. Porém, mais importante do que a presença de artistas sulistas aqui é a presença no mercado do eixo Rio-São Paulo da nova geração de artistas baianos. As galerias baianas precisam ousar e entrar em contato com outras galerias instaladas no Sul para que aquele público conheça a arte contemporânea feita aqui. O conhecimento que eles têm por lá, é apenas, limitado a artistas que estão aí no mercado desde as décadas de 40 e 50. Isto é fruto de uma má política cultural e, recentemente, a coisa tem piorado, com falta de apoio às artes plásticas. Não adiantou criar uma Secretária de Cultura porque os interesses ideológicos se sobrepõem aos verdadeiros interesses de promoção cultural.
Obra de Aldemir Martins: Gato Malhado,óleo sobre tela.
Agora com um título, que no mínimo, podemos classificar de exagerado, “A Arte Atual no Brasil”, será promovida uma exposição que inicia a partir do dia 25 no Salão Atlântico, do Hotel da Bahia, com trabalhos de Manabu Mabe, Aldemir Martins, Carlos Scliar, Tikashi Fukushima, Cláudio Tozzi, Rapport e outros. Evidente  que a vinda de obras desses artistas é interessante, principalmente porque os nossos museus nada promovem. Estão preocupados com o preenchimento de cargos de diretores burocratas do que em realizar.
As obras dessa exposição pertencem a Galeria André, de São Paulo. Não se discute a importância de alguns nomes. O que se questiona e a abrangência do nome e o imobilismo, mesmo dos que negociam com a arte, em promover exposições de artistas baianos fora de nossas fronteiras.

TRÊS ESTUDANTES DE BELAS ARTES VÃO EXPOR DIA 23


Alchimia é o título apropriado para as obras que  serão expostas na Galeria do ICBA, do próximo dia 23 ao dia 8 de novembro, pelos estudantes Andrea May, Paulo Pereira e F. Macedo. Eles buscam mostrar, em suas telas, um trabalho alquímico de “transmutação” da vivência cotidiana pessoal em traços e cores impessoais. Impessoalidade que, como a pedra filosofal dos antigos alquimistas, é fruto de uma realidade que transita entre o racional e o irracional, como bem testemunha Andrea May.                         Paulo e Andréa iniciam bem o caminho em busca da profissionalização.
No seu testemunho, Andrea May afirma que sua alquimia é resultado de impulsos emanados da visão interiorizada de sua realidade cotidiana. “A todo instante, afirma ela, existe na minha cabeça um espaço plástico em constante estado de semivigília e transitando entre o racional/irracional”. E a “transmutação se processa através de imagens unicamente, ao encontro de um limite que, quando chega, não incomoda seu impulso criativo. Na opinião de Juarez Paraíso, trata-se de uma pintura regida pelo emocional e uma resposta imediata ao seu momento de concepção.

Se, para o professor, a dimensão gestual de Andréa May é rica de símbolos, a de Paulo Pereira tem a cor incorporada, com uma espécie de contraponto, na estrutura rigidamente concebida em ritmos verticais de imponentes silhuetas. A pintura dele tem uma identidade: construtivismo. Paulo Pereira, contudo, é, em suas próprias palavras, como um moderno alquimista a procurar “transmutar” o construtivismo impessoal das silhuetas imponentes em um construtivismo vivencialmente ecológico. As imponentes silhuetas são, na realidade, estruturas de uma cerca numa paisagem ideal.
 F. Macedo com uma das obras que vai mostrar.
Quando a F. Macedo, Juarez Paraíso afirma, no texto de apresentação da exposição, que ele apresenta um trabalho muito pessoal e de difícil concepção. Partindo de relações figurais inusitadas, F. Macedo concebe uma estrutura complexa e singular onde há permanência de figuras humanas transfiguradas e geradas por uma fragmentação rítmica que se articula na dimensão do reversível. Figuras que são personagens urbanas expostas numa realidade urbana transfigurada e rica de símbolos igualmente urbanos.Símbolos que o próprio artista confessa como “bem pessoais”.

     O SURREALISMO DE MOISÉS SODRÉ
O caminho do hiper-realismo é o que vem seguindo com desenvoltura o jovem pintor Moisés Sodré, vencedor do último Festival de Arte da Telebahia na categoria de pintura.Sodré é um autodidata disciplinado, que consegue através da sua pintura, mostrar uma personalidade  em franco amadurecimento. À medida que se dedica à arte, como ciência, ele procura galgar os degraus da sabedoria.
Eterno sonhador tem boas incursões, também no surrealismo, uma vez que procura se inteirar dos diversos mistérios do cromatismo, da estética e das técnicas utilizadas pelos profissionais.
Seus trabalhos hoje estão expostos até no exterior, e já conquistaram os primeiros lugares em dois festivais de arte da Telebahia (85/87) e no Salão de Artes Plásticas do Espírito Santo, realizado em maio.




EXPOSIÇÃO ITINERANTE DE TOMIE OHTAKE SEXTA-FEIRA - 30 DE NOVEMBRO DE 1987

JORNAL A TARDE SALVADOR SEGUNDA-FEIRA, 30 DE NOVEMBRO DE 1987

EXPOSIÇÃO ITINERANTE DE TOMIE OHTAKE SEXTA-FEIRA

Na próxima sexta-feira será um dia especial para o movimento de arte baiano, pois a gravadora Tomie Ohtake vai expor 16 gravuras em metal em edições limitadas no Escritório de Arte da Bahia. Está exposição está percorrendo nove capitais brasileiras e reflete o talento desta japonesa de 73 anos, há vários anos, estabelecida em São Paulo, mas que ainda tem muita dificuldade em falar o português. Suas obras têm, realmente, uma grande influência obras tem, realmente, uma grande influência oriental e vendo suas gravuras recentes, entre elas algumas das que estão estampadas no catálogo, traduzem exatamente aqueles gestos; aos ideogramas chineses, cujos traços representam idéias. Lembro da reação de um colega ao ler uma gravura de Tomie. “Minha filha, de sete anos, faz muita coisa parecida com esses riscos”. Evidente, que a reação diante de uma obra de arte corresponde à capacidade de entendimento de cada um. Vai da informação que dispõe e isto corresponde ao nível de leitura de uma obra de arte. As pessoas que assim reagem espontaneamente diante de uma obra de arte não entendem que por trás daquela aparente simplicidade estão longos anos de muito trabalho.

Muitos artistas levam anos e anos desenhando até que se afastam da figuração e abraçam formas mais simples da figuração e abraçam formas mais simples e contemporâneas. As obras de Tomie Ohtake são muito disputadas no mercado de arte aqui e fora do País e esta sua disposição em fazer gravuras em metal objetiva alcançar o grande público, já que os preços dos múltiplos são mais acessíveis. Mesmo assim giram em torno de 16 mil cruzados cada. É bom lembrar que o mercado de arte de múltiplos tem sofrido nos últimos anos uma descaracterização crescente, porque cópias feitas em off-set, assinadas ou não por seus autores, estão sendo comercializadas como se fossem originais. Isto tumultua o mercado. É o caso de chamar a atenção dos colecionadores ou mesmo pessoas que adquirem de quando em vez uma obra de arte, para que se certifiquem se é cópia autêntica ou reprodução em off-set, pois estas não têm valor comercial.No caso destas que serão expostas a autenticidade é garantida pelos organizadores.

QUATRO ARTISTAS VÃO EXPOR NO MUSEU DE ARTE MODERNA
Uma exposição itinerante dos artistas Leonel Mattos; Aprígio; Britto Velho; e Dina Oliveira está montada até o dia 6 no Espaço Cultural Cásper Líbero, em São Paulo, com o patrocínio do Unibanco. Em seguida as obras virão para o Museu de Arte Moderna da Bahia, para a Galeria “O Cavalete”, Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco, em Olinda; Gabinete de Arte Brasileira, em Recife; Museu da Universidade federal do Pará e galeria Arte Liberal, Belém; Galeria Anna Maria Niemeyer, Rio de Janeiro, Oscar Seraphico Galeria de Arte, Brasília; Museu de Arte de Belo Horizonte; Manoel Macedo Galeria de Arte, Belo Horizonte; Bolsa de Arte de Porto Alegre; Museu de Arte Sacra de Santa Catarina; Espaço de Arte, Florianópolis e Museu de Arte Contemporânea, de Curitiba. Como podemos observar é um projeto muito interessante porque vai visitar várias cidades brasileiras até 1989.Ao lado obra de Dina e a influência amazônica.

Vemos também a importância da presença de um estabelecimento bancário dando mo suporte necessário ao empreendimento. São quatro artistas, com trabalhos numa linha de abordagem contemporânea, mas que se diferenciam pela individualidade criativa de cada um.
O coordenador do Espaço Cultural Cásper Líbero é Ivo Zanini que faz a apresentação da mostra salientando esta integração de norte a sul do país por um evento de artes plásticas.           Leonel, abaixo, cada vez mais moderno.
Diz que os artistas nem se conheciam, a não ser pelos próprios nomes através de exposições que fizeram separadamente em locais diversos.
“De repente São Paulo os uniu”, isto porque eles foram para a capital paulista em busca de novas oportunidades para mostrarem a sua obra. BritoVelho é do Rio Grande do Sul, a Dina Oliveira do Pará, Ricardo Aprígio veio de Pernambuco e o Leonel Mattos, o único baiano do grupo. Cada um com sua temática, onde as figuras humanas e animais são tratados com sobriedade em múltiplas facetas. O Britto Velho brinca com a forma.
Nos informa Zanini que o homem é a meta do gaúcho Britto Velho que pinta com cores fortes, sempre dando a notar a presença da figura humana em formas completamente diferenciadas das que estamos acostumados a ver nas ruas ou mesmo ao nosso lado. Uma mistura de sátira e, como que tivesse fazendo brinquedo de armar deixando que o espectador crie os contornos. Tudo depende de sua imaginação e de certa forma estampa a nossa fragilidade através de um jogo de anatomia.
A única mulher do grupo é Dina Oliveira.
Ela sofre uma influência marcante do clima da Amazônia. São construções bem elaboradas, mas que deixam transparecer algo que tem a ver com a flora e a fauna. Mesmo com as formas indefinidas, onde não se nota qualquer proximidade com a figuração. Ela consegue belos feitos visuais que agradam a qualquer espectador mesmo àqueles que não conseguem fazer uma leitura mais apurada da sua obra pela combinação de cores e formas.
O nosso Leonel Mattos explode em simbolismos. Sua arte vem melhorando a cada dia na medida em que se afasta da figuração e trabalha com formas mais livres. É um artista de talento, sobre o qual já tenho escrito várias vezes. Porém, a cada exposição, Leonel surpreende por sua fertilidade, pela sua capacidade de não se repetir. Sempre há novidade dentro de uma linha de coerência e qualidade. Neste jogo entre o formal e o informal, ele vai construindo o seu mundo pictórico com muita habilidade.
Ricardo Aprígio nos leva sempre a procura de um detalhe, que embora pequeno, consegue atrair a atenção. São composições que expressam o imaginário, mesmo quando trabalha com abstrações. Tem especial cuidado pelas texturas que utiliza para compor suas pinturas.
Enfim, vamos aguardar a chegada das obras destes quatro talentosos artistas que estão perfeitamente comungando com a modernidade.
Sabemos que estão em processo de criação e que, daqui para frente, muita coisa nova eles ainda terão que criar para enriquecimento da arte brasileira.
Ao lado o imaginário de Ricardo Aprígio.


ALGUNS ESTRANGEIROS NA 19ª BIENAL (FINAL) - 09 DE NOVEMBRO DE 1987

JORNAL A TARDE SALVADOR SEGUNDA-FEIRA, 09 DE NOVEMBRO DE 1987.

ALGUNS ESTRANGEIROS NA 19ª BIENAL (FINAL)

Neste último artigo sobre a 19ª Bienal Internacional de São Paulo, vou enfocar alguns artistas estrangeiros, cujas obras merecem destaque. Inicialmente temos que falar de Marcel Duchamp, o pai das vanguardas das últimas décadas, representado por várias obras cedidas pelo colecionador Arturo Schwarz, radicado em Milão, e pelo Moderna Museet de Estocolmo, além de documentos e fotografias da réplica do Grande Vidro. Sua presença está intimamente relacionada com sua importância como artista que foi e, principalmente, porque este ano é o centenário do seu nascimento. A curadora geral da bienal, Sheila Leirner, justifica a presença de Duchamp dizendo que é um contraponto para o embate ‘Utopia versus Realidade’. Duchamp é um marginal diante dessa questão.
Um outsider que revolucionou o pensamento e o olhar sobre a arte do nosso século. Assim, nada mais natural que merecesse uma exposição especial, inédita na América Latina.
Sem dúvida que é extraordinária a obra do escocês David Mach, uma grande instalação feita com 15 toneladas de revistas, que são dispostas sem qualquer colagem ou recortes.
Por cima delas um trator que nos dá uma sensação de total destruição, levando à sua frente, com a força dos seus cavalos invisíveis, tudo que o David resolve captar como elemento e integrar à sua obra. Esta sua identificação com retalhos da produção industrial ou da sociedade de consumo é fruto de
uma observação que o acompanha desde o tempo de estudante, quando aproveitava as férias de Verão para trabalhar como operário em fábricas. Ele ficava impressionado com os excessos de produção. Não trabalha com sucata. Suas obras são sempre construídas com objetos novos, como os que usou nesta sua instalação na Bienal paulista.
Ele disse gostar de trabalhar em público, ao contrário de muitos artistas que preferem o silêncio do atelier, “porque as pessoas fazem perguntas perturbadoras que nos obrigam a pensar”. Podemos destacar que as 15 toneladas de revistas, o trator e outros objetos do nosso mundo real que utiliza em sua instalação permitem a criação de várias imagens de acordo o ângulo em que o visitante se coloca para examinar a sua obra.
A instalação passa uma imagem de um turbilhão de revistas que vai invadindo os espaços e o trator cumprindo o seu papel de levar adiante o resultado daquela catástrofe. A instalação pode servir ainda a muitas leituras, e, como diz Mach, “eu me interesso na diferença entre a insensibilidade da produção em massa, a maneira não espiritual com que as coisas são feitas e a afetividade que se pode ter por alguma coisa”
A FAMÍLIA BOYLE
Todos que lêem sobre arte já conhecem os trabalhos da família Boyle ou pelo menos já devem ter ouvido falar. Na Bienal a família apresenta 12 relevos em fibra de vidro e todo o seu trabalho é formulado nas observações nos solos em várias partes do mundo, ou seja, desde uma rua movimentada de uma grande metrópole à superfície de um deserto. Mark Boyle, o chefe da família, nasceu em  Glasgow, estudou Direito e, em 1964, iniciou com Joan Hills os trabalhos com a superfície da Terra. Mais tarde, os filhos do casal, Sebastian Boyle e Geórgia envolveram-se também nesse trabalho e os quatro passaram a assinar como Família Boyle
Eles tem viajado pelo mundo afora recolhendo material para o seu trabalho que é realmente arrebatador. Diz Mark Boyle que “ao contrário do que pensam as pessoas que conhecem o nosso trabalho, não existe uma fórmula para executas as nossas peças.                                                                     Detalhe de uma obra executada pela Família Boyle.
É fatal engano imaginar que sabemos como vamos fazer uma determinada superfície.
O que é importante é que nós que tivemos oportunidade de ver de perto obras da família Boyle ficamos visivelmente impressionados com a capacidade inventiva do grupo e a habilidade em transportar para seus relevos imagens que estão gravadas no solo de várias partes do mundo. Os mínimos detalhes, como uma ponta de cigarro amassados numa velha calçada de Londres são reproduzidos com perfeição. É um trabalho apurado com as resinas e conseguem dar o colorido exato.

ERWIN WURN

O austríaco Erwin Wurn, festejado em sua terra, apresenta uma instalação onde une e superpõe objetos utilitários de metal, especialmente grandes tachos e latões que nos dão a impressão de estarem soltos., disponíveis à assumir variadas e intrigantes posições, juntamente com a Brigite Kowanz, representa a Áustria e nos informa Peter Baum que ele, com 30 anos de idade, foi homenageado com o prêmio Otto Mauer, e já apresenta como referência uma obra pluralística e de grande conseqüência, ilustrando claramente, através da contrapontuação na utilização diferenciada da cor, a mudança,, a seqüência de  materiais aplicados, tais como madeira, concreto, palha e chapa de alumínio

Acima obra do austríaco Erwin Wurn,com objetos utilitários.

MARGRETE SORENSER

A dinamarquesa Margrete Sorenser apresenta quatro séries de escadas reais ou oficinas, que se dirigem para uma plataforma. Todos que visitam a exposição imaginam subir as escadas, porém isso não é possível.
O movimento é indicado, mas não de forma física. É o movimento do material para o imaterial. Na realidade trata-se de uma escultura em forma de cruz, já conhecida em Copenhague, onde foi montada há cerca de dois anos.
Para Oystein Kjort a obra de Sorenser pode ser considerada uma apresentação teatral, durante a qual o observador convidado a ver as amplas possibilidades do espaço, encontrando-se, de sonho e obsessão, de posse do desconhecido.
Podemos ainda destacar as obras do alemão Anselm Kiefer, com sua pintura que prima por anotações nebulosas de arquitetura e paisagens.
Uma atmosfera que para alguns críticos de arte evoca temas históricos e a própria mitologia germânica. Para outros, alude ao arcaico, a um passado fora do próprio tempo presente, lembrando a atitude dos antigos mestres alemães.
Também o japonês Tadashi Kawamata, mora em Tóquio, apresenta uma instalação composta de duas partes. No pavilhão da Bienal tem uma documentação fotográfica e explicativa de sua obra e, numa rua próxima ao parque de Ibirapuera fez uma montagem usando sarrafos de madeira numa casa em ruínas.


OS BRASILEIROS NA BIENAL DE SÃO PAULO (1) - 26 DE OUTUBRO DE 1987

JORNAL A TARDE SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 26 DE OUTUBRO DE 1987.

OS BRASILEIROS NA BIENAL DE SÃO PAULO (1)


Um dos trabalhos de Luiz Zerbini, onde aparecem figuras numa piscina.
Acabo de retornar de São Paulo onde visitei demoradamente a 19ª Bienal Internacional. Fiquei impressionado com alguns artistas latino-americanos, os quais não devem nada em termos de qualidade e contemporaneidade aos mais famosos e destacados estrangeiros convidados. Quanto á representação brasileira, composta de 23 artistas, não encontrei nada de sensacional. Não sei que critérios nortearam a comissão de arte e cultura da Bienal. Senti uma preocupação muito grande com a inovação ou com o tema Utopia versus Realidade e grandes falhas na execução. A instalação do Juracy Dórea, por exemplo, ficou muito mal produzida, dando a impressão de uma porção de posters espalhados, sem muito critério.
Acho que se o Juracy levasse à Bienal os painéis coloridos, os originais, sua obra estaria melhor representada. Quanto ao Ivens Machado, catarinense que reside e trabalha n Rio de Janeiro, apresenta oito peças escultóricas de proporções feitas em cimento, pedras, óxido de ferro. Ivens é um conceituado artista brasileiro, já tendo exposto em várias galerias do Rio e São Paulo. Seu trabalho, no entanto, não sensibiliza a maioria dos visitantes, como tive oportunidade de constatar com as diversas pessoas que conversei.
Já o Rogério Nazari e Telmo Lanes, do Rio Grande do Sul, com sua instalação composta de 25 pinturas feitas segundo processo e imagens tradicionais, calcadas em elementos do absurdo, demonstram que conhecem bem a técnica da pintura e souberam jogar todos os elementos, inclusive com um fundo musical perfeitamente enquadrado à proposição.Na realidade, os dois conseguiram estabelecer um discurso místico com o público que procurava entender a cada passo o naturalismo romântico ali explicitado na sua obra. Rogério é arquiteto e Telmo tem fundamentação no estudo das Letras.
Karin Lambrecht, também de Porto Alegre, apresenta uma pintura registrando o gesto, não como representação gráfica, mas como captação da energia, do movimento e do momento da matéria e ganha a tridimensionalidade ao formar um mesmo conjunto com objetos de madeira e sucata.
Luiz Hermano, com sua visão lúdica do mundo, materializa imagens que mantém um parentesco próximo com as do desenho animado e da história em quadrinhos.São quadros de grandes dimensões com espaçonaves que vagueiam de um lado para o outro em meio a constelação de estrelas e astronautas que flutuam em espaços azuis, entremeados de pontos brancos, indicando estrelas.Um trabalho agradável, bem próximo dos quadrinhos que tanto encantam as crianças.
Márcia Grostein, de São Paulo, reside e trabalha em Nova Iorque, apresenta uma instalação intitulada Os 7 Continentes com pinturas utópicas sobre partes imaginárias da Terra.
Iran Espírito Santo, de Mococa, São Paulo, ironiza com suas pinturas, desenhos, objeto e instalações os modos tradicionais de representação.
César Brandão, Minas Gerais, apresenta Spurbeuyflycheckmate contra o canto das sereias, onde há comentários sobre as pesquisas plásticas e estéticas de Marcel Duchamp, Leonardo da Vinci, Josef Beuys, Drummond e Titãs etc. Ele utiliza materiais como o mel, o couro, a cera, barbantes e discute a sedução exercida pela utopia em contraste com a realidade.
Geórgia Creimer, paulista, residente em Viena, Áustria, mostra pinturas feitas em 1987 e integram uma instalação simbólica onde a força individual de cada trabalho, o seu funcionamento, dependem intrinsecamente da relação entre si e o espaço que ocupam. As peças adquirem uma quantidade específica em função da posição, canto ou altura onde foram colocadas para que atuem em ralação ao público em uma outra dimensão.
Cássio Michalany, também paulista. Como podemos observar, há uma prevalência quase absoluta de paulistas entre a representação brasileira. Ele mostra quatro trabalhos com uma tendência de sintetizar os elementos componentes, concentrando atenção em questões específicas a pintura como o espaço, a cor, sempre livres de qualquer tipo de significado e representação. Cássio explora as relações entre superfícies monocromáticas e texturizadas.
Dudi Maia Rosa, São Paulo, nos anos 70, seus trabalhos se caracterizam por transcrever objetos e cenas cotidianas com traçados livres, cores vibrantes e atmosfera luminosa. Observa-se no decorrer dos anos 80 uma progressiva diluição destas imagens e sua transformação em zonas de cor, grafismos cromáticos e inscrições sobrepostas em camadas sucessivas. No início de 84, Dudi intenciona com sua obra banir conceitos, idéias, significados e de concentrar na obra com existência em si mesma, definida somente em suas qualidades físicas: formas geométricas simples, cor, estrutura e oposição opaco-translúcido.
Afirma ele que em seus trabalhos sua ação acontece no interior da pintura, por usar pigmento envolvido em poliéster sob uma camada de fibra de vidro.
Artur Lescher, São Paulo, com seu Aerólito discute o espaço do edifício da Bienal projetado por Niemeyer. Lembra um Zepelim, todo feito de cor, Lâminas de metal com cor prateada que ficam flutuando. São dois. Um do lado de fora e outro dentro, separadas pela vidraça do prédio.
Ângelo Venoso, de São Paulo, apresenta quatro esculturas de grandes dimensões, usando madeira e tecido gomado e pintado.Suas esculturas se configuram em formas orgânicas e zoomórficas, aludindo ao arcaico e a vivências primárias.
Cynthia Vasconcelos, Porto Alegre, mostra oito pinturas.
Ana Maria Tavares, de Belo Horizonte, sua instalação ocupa 228m² e compreende painel com desenho e pintura, esculturas em aço e vidro. Trata-se de um trabalho que revela colisão, desarmonia e influência da “baixa cultura” característica das novas gerações. 
Tunga, Palmares, pernambucano, mora e trabalho no Rio. O arquiteto Tunga chama a atenção de todos que visitam a Bienal. Sua instalação está bem no centro do edifício e uma imensa cortina de  limalha de ferro pesando duas toneladas pende do teto e no chão chapas de ferro servem de piso para o resto da instalação que ainda utiliza ímãs. O seu trabalho é coerente com tudo que Tunga vem mostrando desde 74, quando iniciou sua trajetória como artista plástico. Muitos não gostam do seu trabalho. Mas é intrigante e ninguém consegue ficar imune com sua presença.
Sérgio Romagnolo, paulista, trouxe sete esculturas em fiberglass, com tamanho variando entre 120 e 270cm, configurando imagens vindas da cultura de massa. Esses trabalhos são cheios de humor e crítica, e discutem as questões da representação emergentes da pintura.
Eliane Prolik, de Curitiba, é a atual diretora do Museu Alfredo Anderson e Atelier de Arte, em Curitiba. Com sua instalação “Lúmen”, ela utiliza as características de iluminação do Pavilhão da Bienal, trabalhando com luz e sombra e as metamorfoses ocasionadas pelo papel heliográfico.
Alexander Pilis, Rio de Janeiro, reside e trabalha do Canadá. Sua tese “memória Coletiva, o território da morte” sugere que os locais, construções, os objetos e símbolos ligados à morte obedecem aos mesmos códigos e procedimentos empregados na “Cidade dos Vivos”. Sendo arquiteto, sua instalação Architecture Ego: Codes of Disruption, discute exatamente esta região.
Milton Macahdo, carioca, com sua instalação Hi-Fi” (alta fidelidade) consiste no empilhamento de macotecas de aço sobre estrutura tubular e música eletroacústica de autoria de  Rodolpho Caesar. Ele mostra ainda o “Semáforo” que consiste no empilhamento de 25 lâminas de vidro planos, pintadas de vermelho, amarelo e verde e fonte luminosa que projeta as cores no ambiente e nos visitantes. Mas, sem dúvida, que a “Hi-Fi” é que tem mais força e impressiona, principalmente com a perfeita coordenação com sons metálicos. As mapotecas são pintadas de preto e o ambiente fica apropriado para imaginações.
Heloísa Pini, outra paulista. Sua instalação mede 108m², usa aço carbono e tecido emborrachado de ar.
Luiz Zerbini - com três instalações Solimões com o Negro, com 30m² azulejados em preto e mármore, com iluminação artificial e um sofá onde flutua um boto.Tempestade em copo d’água, onde uma imensa cortina torcida desemboca em um copo. O Sistema, formada por 50 carrinhos de feira contendo objetos encaixados formando um círculo, de modo que ao movimentar um todo o círculo se move.
Falei propositadamente, com certa rapidez, sobre todos os brasileiros para que aqueles que não verão a Bienal tenham pelo menos uma idéia da nossa representação. Muita coisa exposta, mesmo em nome do nosso país, é passível de muita discussão. Os critérios subjetivos  de escolha e concepção correm por linhas e caminhos paralelos e que  muitas vezes se encontram em locais indefinidos.Se é que se encontram...


As criativas fachadas nordestinas enfocadas por Ana Mariani.
Mas não posso deixar de registrar aqui a minha satisfação em encontrar na Bienal, fotografias de fachadas de casinhas da cidade onde moram meus pais e onde passei minha infância. É a querida Ribeira do Pombal, enfocada pela sensibilidade de Ana Mariani, que é baiana, e reside em São Paulo.
Ela enfoca cores fortes, as formas curiosas das fachadas das casas nordestinas. Cruzou o sertãozão nordestino e foi captando as fachadas multicoloridas que trazem o traço da cultura nordestina. Em algumas surgem verdadeiros signos, abstratos outras vezes figurativos. E algumas fachadas de casinhas pombalenses estão lá fora para todo visitante admirá-las.


TRÊS MIL OBRAS COMPÕEM A 19ª BIENAL DE SÃO PAULO - 05 DE OUTUBRO DE 1987


JORNAL A TARDE SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 05 DE OUTUBRO DE 1987.

TRÊS MIL OBRAS COMPÕEM A 19ª BIENAL DE SÃO PAULO


A Bienal de São Paulo é um dos fatos mais importantes no campo da criação em todo o mundo. Esta é a 19ª vez que artistas das mais variadas tendências e origens aportam na capital paulista com seus trabalhos, imbuídos no espírito de atualidade, da realidade e da fantasia. Este ano nada menos do que 53 países estão representados com o que existe de mais radical, de mais avançado no campo da arte, onde há lugar para tudo, desde a extravagância de passear montado num cavalo branco a colorir o gramado com saquinhos plásticos.
O Ministro Celso Furtado, da Cultura,quando inaugurava a Bienal.
É um projeto tão grandioso, que somente aqueles que estão diretamente envolvidos nos contatos com os artistas, no recebimento das obras, na definição dos espaços, no assessoramento aos estrangeiros convidados, enfim, em toda uma complexidade de atitudes, que são tomadas e que passam quase despercebidas, poderão avaliar as dificuldades. Todos os anos jornalistas e outros especialistas como os críticos, marchands e muitos artistas imaginaram que a Bienal não será aberta na hora prevista. Mas a improvisação brasileira é grande e, a Bienal abre, quase sempre, na determinada, mesmo que alguns operários ainda estejam lavando as escadarias e outros movimentando suas ferramentas às pressas para terminar mais uma montagem.
Faço um reparo contra a má divulgação do evento. A Bienal já é notícia. Sobre este manto descansaram os responsáveis pela sua divulgação. Não enviaram nada para os outros estados.
Mesmo este colunista que é cadastrado na Fundação Bienal de São Paulo sempre recebeu um volume considerável sobre as bienais anteriores. Nesta muito pouca coisa. O sistema de comunicação foi falho, inclusive conversei com outras pessoas envolvidas na divulgação do movimento artístico em outros estados e a reclamação persiste.

MUITO DINHEIRO

O custo do evento está estimado em CR$ 110 milhões sendo que 53% provêm de patrocínios, 16% de doações, 6% de material promocional como venda de catálogos, cartazes, camisetas, e 25% dos governos federal e estadual.
A fundação ainda arca com a despesa de estadias dos artistas estrangeiros e nacionais, convidados. Dos 61 artistas brasileiros, somente 23 se enquadram nesta categoria, enquanto cerca de 300 artistas que representam 53 países apenas quatro foram convidados pela Bienal. Inicialmente seriam convidados 10, mas os custos chegaram a promover esta redução.
Os gastos são consideráveis.A Fundação tem cerca de 80 funcionários fixos, pois funciona durante o ano inteiro e no pico da Bienal chegam a quase 300.

PÚBLICO

O papel da Bienal é importante sobre todos os aspectos. Possibilita em primeiro lugar, acesso do público às manifestações de vários países, mesmo aquele público que normalmente não dispõe de facilidades ou oportunidades de freqüentar galerias e museus. Leva uma infinidade de jovens estudantes, através de caravanas devidamente programadas, com instrutores mostrando o significado de cada trabalho, falando do artista, de toda a engrenagem e cultura que levaram a conceber tal obra. Portanto, educa, instrui, informa e desperta no jovem o amor pelas artes.
Como diz o crítico Ronaldo Brito “a sensação de irrealidade que costuma pairar sobre as último bienais resulta, exatamente, a meu ver, da obsessão do real. Da tentativa à priori frustrada de apresentá-las como espetáculo, extensão mais ou menos grandiosa, mais ou menos erudita, da trama de cultura e lazer que aparentemente encerra e esgota a experiência estética no mundo atual.
Ora, essa experiência, ao nível em que ocorre no trabalho de arte, é tudo menos espetáculo e uma forma de lazer. Na prática, imagino e compreendo parecerá quase impossível iludir a pressão neurótica do real: como submeter à pesada materialidade econômica e institucional de esquemas como a Bienal às manobras surdas e recalcitrantes, notoriamente críticas, da arte contemporânea?

DUCHAMP

O grande jogador de xadrez e pintor cubista Marcel Duchamp está representado na Bienal por suas obras. Embora já tenha falecido, é como se estivesse presente, com seus experimentos do campo da ótica. As obras foram cedidas pelo crítico e curador da mostra Arturo Schwarz e pelo Moderna Museet de Estocolmo. A mostra reúne fotos, gravuras, desenhos, “ready-mades” e documentos.
No seu silêncio, Duchamp pode ser percebido nos “ready-mades” onde o artista, “coerentemente com a reprodutibilidade industrial, se recusa a fabricar a obra. O artista rejeita o fazer artesanal da obra e esta deixa de ser o caráter artístico materializado.
A obra coloca-se, assim, além e acima deste fazer, ou em seu extremo oposto: não no fazer, mas no ‘fa-zero”’, diz Norval Maitello Jr.
Entre as obras  estão sendo destacadas “Roda de bicicleta, que é uma roda de bicicleta invertida e encaixada num banco, datada de 1913, “Fonte”, um urinol de porcelana de cabeça para baixo, de 1917, todos considerados “ready-mades”, por serem invenções do artista sobre objetos já prontos. Integra a mostra “Nu descendo uma Escada”, 1912, que provocou escândalos e polêmicas, sendo inclusive recusado pelo Salão dos Independentes de Paris, em 1912.

REPRESENTAÇÃO INGLESA
As informações chegadas a esta terra dizem que a seção britânica tem trabalhos originais, embora sejam apenas duas exposições, cada um comporta múltiplas reflexões e impactos.
Uma é a família Boyle, que apresenta os últimos registros de sua viagem “Viagem à Superfície da Terra”. São os famosos fragmentos de pisos e solos de toda parte do mundo, desde o deserto central australiano, à neve dos Alpes, becos de Londres, enfim, qualquer local onde esta família ache alguma coisa significativa.
Já o escultor escocês Davis Mach, apresenta obras em escala monumental, com os excedentes da produção industrial em série.Os Boyle tratam do casual, do inexorável e Mach “da porção da eternidade inscrita no provisório”.
O escocês David Mach quando terminava a montagem de sua obra,com um trator andando por cima de uma pilha de revistas.

TRÊS MIL OBRAS

São nada menos que três mil obras tratando da Utopia e da Realidade. È preciso no mínimo três horas para percorrer 30 mil metros quadrados, uma verdadeira maratona. São quadros, objetos, das mais variadas formas e cores. Chega a cansar. Basta dizer que o pessoal que estava trabalhando na montagem usava bicicleta e patins para andar de um lado para o outro. Mas vale a pena. É um banho de cultura, de civilização, e a gente sai com mil perguntas no ar sobre a contemporaneidade. Quatrocentos artistas de 53 países colocaram ali o que existe de mais criativo entre a Utopia e Realidade e nada melhor do que este choque entre a realidade que nos cerca, tão cheia de utopia. Neste caminho pode-se fazer uma analogia inclusive da própria existência do homem como criador, da realidade e de suas fantasias.
A própria curadora Sheila Lerner, integrante da corrente que defende temas para bienais, escolheu “Utopia versus Realidade”, o qual permite muitas interpretações. Para ela esta Bienal “não traduz os gestos do passado e não usa a retórica para modelar esses gestos. Apropria-se de elementos do passado de uma forma empírica, mas detecta elementos do presente. Tudo isso para tornar didática e compreensível a produção contemporânea”. Breve visitarei a Bienal, quando mostrarei mais detalhes das obras lá expostas. Aguardem.

domingo, 28 de outubro de 2012

NOVAS PROMESSAS OFICIAIS NA ÁREA DAS ARTES PLÁSTICAS - 12 DE OUTUBRO DE 1987.

JORNAL A TARDE, SEGUNDA-FEIRA , 12 DE OUTUBRO DE 1987. 

NOVAS PROMESSAS OFICIAIS NA ÁREA DAS 
ARTES PLÁSTICAS

Chegou tarde. Porém, como diz o povo, “antes tarde do que nunca”. Espero que o nunca seja afastado. Na realidade, o projeto que tardiamente o secretário de Cultura do estado assegura que colocará em plástica, ainda está no plano dos sonhos e das promessas. Como neste país planejamento a longo prazo significa que a obra nunca será executada, tenho muita desconfiança que a bienal baiana será revitalizada, que haverá mapeamento e apoio às produções do interior, que será criado um Centro de Referência de Artes Plásticas no Solar do Unhão, e, finalmente, que vão ser realizadas grandes exposições coletivas de arte contemporânea produzida aqui.. Projetos necessários e reclamados por todos nós que acompanhamos o movimento de arte na Bahia. Nada disto é novidade. Foto atual de Zivé Giudice.
Lembro que denunciei a discriminação com relação às artes plásticas em detrimento de outras manifestações, principalmente  a música, da qual o atual secretário é integrante, quando do lançamento do Projeto Feira Arte. Agora recebo um release com estas promessas. Mas o protesto valeu, porque foi um alerta. Quanto ao apoio à produção de arte originária no interior, infelizmente, tenho quase certeza que serão premiados os peemedebistas, petistas, e outros em detrimento de outros artistas, que antes eram governo, e, portanto, beneficiados, e agora serão esquecidos. São lados de uma mesma moeda e a arte virá política e gangorra nas mãos de pseudos intelectuais.
A prioridade do Departamento de Artes Plásticas da Fundação Cultural,segundo Zivé Giudice é para ações mais coletivas.Como afirma ele, poucos eventos significativos no campo das artes plásticas se realizaram na Bahia depois das bienais, a não ser alguns salões esporádicos, mas que não tiveram continuidade.
|Assim, a produção contemporânea, principalmente a partir da década de 70, se ressente da falta de intercâmbio com os outros centros, a não ser alguns casos esporádicos de artistas individuais que tentam este diálogo por iniciativa própria. O que nós precisamos é estabelecer o diálogo com os outros centros e com a própria comunidade de forma mais incisiva e com certa regularidade para o próprio desenvolvimento das artes plásticas.
A realização de exposições coletivas para permitir uma amostragem da nossa produção, assim como o intercâmbio com outros centros não significa que o artista, individualmente, não tenha vez no Departamento de Artes Plásticas, conforme esclarece o diretor: “N[os vamos atender, dentro do possível, as solicitações individuais.O Departamento inclusive , realizará regularmente concurso de projetos para exposições individuais”. Independente deste concurso, todos os artistas podem participar, das sugestões e contribuir com as mações coletivas do Depap, inclusive participando das exposições coletivas. Para isto ocorrem reuniões quinzenalmente, às terças-feiras, às 17 horas , no terceiro andar da Biblioteca Pública, nos Barris, aberta aos artistas plásticos interessados.

          O MUNDO SOLITÁRIO DE FERNANDO LISBOA
Fernando Lisboa, 25 anos, estudante de arquitetura, sempre teve a vocação para arte, particularmente para a pintura. Começou desenhando aos 5 anos e vem se dedicando insistentemente ao que define como “um exercício interessante”. Seus trabalhos baseiam-se no realismo fantástico, segundo afirma; “ procuro sempre através dos meus q2uadros, expressar a solidão e as angústias do homem moderno na tumultuada sociedade urbana”.
Essa temática tem muito a ver com o próprio artista, que se diz ser uma pessoa inquieta na busca incessante de novas descobertas e ao mesmo tempo marcada pelas dificuldades, pela tristeza e também pela solidão. Ele afirma que sabe dos problemas que irá enfrentar ingressando definitivamente na vida artística.Mas entende que com esforço e vontade, os empecilhos poderão ser superados.
“Na verdade : não conheço bem o mercado de arte da Bahia> Imagino que terei dificuldade. Todavia, tenho também pleno desejo de vencer e quando a persistência é mais forte, acabamos por ultrapassar as barreiras”, lembra. Ele vai expor dia 22, na Galeria de Arte Viva, do Farol Praia Center.



A SENSUALIDADE DA MULHER EM 20 QUADROS DE MASO - 21 DE SETEMBRO DE 1987


JORNAL A TARDE SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 21 DE SETEMBRO DE 1987

A SENSUALIDADE DA MULHER EM 20 QUADROS DE MASO


O resultado de três meses de trabalho incessante do artista Maso está sendo mostrado na Galeria Mato Grosso 50, em São Paulo. São vinte pinturas a óleo, onde o artista mostra toda a sensualidade da mulher. Nos corpos retorcidos ressaem detalhes do tronco e das coxas em movimentos devidamente estudados. Uma pintura limpa, onde o espectador fica procurando olhar com mais cuidado alguns-detalhes, como os pelos, distribuídos pelo corpo, uma gotícula de água estrategicamente colocada. Enfim, neste jogo de luz e sombra, Maso vai construindo o seu mundo pictórico entre a fotografia, base de sua arte, e a pintura. Ele consegue colocar as pinturas muito realismo, ao ponto de provocar excitações em algumas pessoas mais sensíveis.
Prefiro vê-las pelo lado da arte, da poética, da sensualidade que evoca situações de contemplação, imagino a técnica, o desenho, a fotografia sendo revelada e transportada para a tela branca. Imagino as primeiras pinceladas, as fases posteriores, onde as formas começam a se definir até que toda a sensualidade chegue e se fixe forte e bela nos olhos de quem sabe enxergar. Com uma tranqüilidade invejável, Maso vai seguindo por este labirinto de corpos nus. Porém uma nudez celestial, romântica até, que não choca. Apenas eleva os sentimentos, principalmente daqueles que gostam e apreciam a beleza da mulher.

           UMA OBRA DIVIDIDA ENTRE O BEM E O MAL QUE NOS CERCAM

Familiarizado rapidamente com os pincéis da vida, os que lhe dão colorido e os que também pintam a lúgubre amargura da alma, já aos 13 anos Carlos Araújo representava o Brasil em uma exposição internacional realizada em 1963, em Bruxelas.
“Alegoria do Carnaval” foi o painel que o fez saltar pela primeira vez as fronteiras brasileiras.
Dez anos mais tarde, voltou a participar, em Bruxelas, na exposição “Imagens do Brasil”, mas ao contrário do que se podia acreditar, Carlos de Araújo nunca sentiu maior desejo de abandonar sua terra para tornar mais amplo seu universo artístico.
Embora já tenha trabalhado em Nova Iorque no início do gigantesco painel América (15 metros X 14 metros), destinado a expressar em pintura a força telúrica do continente americano, somente agora sentiu um desejo maior de divulgar seu trabalho em todos os continentes.
Em Paris, decidiu aceitar a edição de um livro sobre sua obra e também programar uma série de grandes exposições européias e interamericanas.
O Museu de Arte de São Paulo parecia estar monopolizando até agora o produto da esotérica obra de Carlos de Araújo Filho.Pintor figurativo, este artista brasileiro já tem em seu cofre uma obra de 1.300 quadros.
Eu sou minha pintura. Minha pintura é uma ambigüidade. Pessoas divididas entre o bem e o mal.
A eterna luta do homem, disse o brasileiro ao classificar sua obra.Aos 13 anos, fiz uma de minhas obras mais fortes, pois tinha maior liberdade de expressão. Não tinha compromisso algum com a sociedade, nem com a própria pintura.Estava livre de influências, explicou.
Se ele sempre se considerou um pintor figurativo, com uma marcante influência renascentista, por suas origens italianas e porque estudou a fundo este movimento produzido na Europa nos séculos XV e XVI, agora tem o desejo, “ a capacidade e a força” para tornar-se um “pintor político-social”. O Renascimento deu uma libertação quase absoluta ao artista da época, embora respeitando a forma e os cânones clássicos e com a noite dos tempos, muitos pintores e escultores, logicamente, herdaram tal liberdade, na busca da beleza mais exigente.
Carlos de Araújo se sente renascentista.
Quero ser um cronista de minha época. Sinto-me preparado para refletir em minha obra a realidade próxima da pobreza espiritual, que por sua vez está refletida na pobreza material do homem, explicou.
O esotérico e o terreno. A ambigüidade de um pintor moderno.

LIANE KATSUKI COM MUITAS ATIVIDADES NA HOLANDA

  Liana Katsuki trabalha muito.
O sol voltou a brilhar no início deste mês na Holanda e Liane Katsuki manda notícias sobre suas atividades. Diz ela que o verão foi horrível com muito frio, dias cinzas e chuvosos. “Os raríssimos dias de sol, só fizeram aumentar as saudades do meu País, e acelerar meu desejo de logo estar aí”.
Vemos, portanto, uma Liane saudosa deste sol que brilha com intensidade nesta Bahia cheia de dengo e alegria. Mesmo nos tempos de vacas magras, que vivemos, os que teimam em destruí-la não conseguem, tal a sua presença forte.
Atualmente ela está no Teatro Smedery (na New Jonker Street) fazendo uma performance de suas jóias e desenhos com um grupo de dançarinos. A coreografia é baseada no projeto de Liane que trabalhou inclusive todo o cenário. Está ainda mostrando seus trabalhos em Amsterdam, na Galeria da Vila Baranka, juntamente com 22 mulheres sul-americanas.                              
O nome desta mostra é Dochters Van Moeder Aarde.
Dia 22 a inquieta Liane estará com seus desenhos e esculturas na Galeria Mediation Art Today, em Amsterdam. Ela trabalha ainda para uma fábrica e uma escola de computadores.
Diz ainda Liane que presenciou um movimento muito significativo na cidade de Emmen, onde está residindo. Toda a cidade foi povoada de esculturas monumentais colocadas estrategicamente nos parques, lagos, em frente aos edifícios públicos, nos jardins, e os lojistas convidaram os artistas a expor seus quadros nas vitrines.
Tanto os artistas amadores como os profissionais participaram do evento que contou com o apoio da prefeitura municipal. Lembra a artista baiana que temos tanto espaço e tantos lugares bonitos  em Salvador que seria  um boa ideia um movimento deste nível envolvendo toda a comunidade.
Mas minha cara Liane a distância entre os elos de cultura e civilização da Holanda e o Brasil é muito grande. Estamos num país carente de tudo. De caráter, de comida, de transporte, de escola, de educação, de cultura, enfim aqui tudo está por chegar. Quando se consegue fazer um movimento na área cultural é quase um milagre. As dificuldades são imensas. A falta de apoio uma razão muito forte ao desestímulo.
Enfim, vamos continuar teimando em realizar.

                               LINA BO BARDI TRARÁ SUA EXPERIÊNCIA PARA A BAHIA

Dentro de poucos meses estarão concluídas as obras de restauração de quatro casas no quarteirão da Misericórdia. O projeto, que prevê a permanência dos moradores da área, além do funcionamento de centro comercial e restaurante nos casarões, será a primeira grande experiência de recuperação do Centro Histórico do Salvador na atual administração municipal. A depender dos resultados, obras semelhantes poderão ser executadas em toda a área tombada como patrimônio da humanidade pela UNESCO, órgão cultural da Organização das Nações Unidas.

                                                                               
      Lina reencontra a Bahia 
depois de 22 anos.
A informação  é da arquiteta Lina Bo Bardi, autora do projeto que vai utilizar a tecnologia de argamassa armada, desenvolvida pela Fábrica de Equipamentos Comunitários da Prefeitura. Criadora, em 1959, do Museu de Arte Moderna da Bahia, entre outros projetos arrojados da Arquitetura contemporânea, Lina Bo Bardi foi entrevistada no programa, o presidente da  Fundação Gregório de Mattos, Gilberto Gil, falou sobre a importância da arquiteta Lina Bo Bardi no desenvolvimento cultural da Bahia.
É mais uma das muitas promessas que os moradores do centro e mesmo de Salvador estão cansados de ouvir. Estamos registrando e futuramente vamos cobrar. A memória do brasileiro costuma ser curta.
Mas vamos fazer força para cobrar sempre.



A ARTE DE LEONEL MATTOS EVOLUI COM MUITA RAPIDEZ - 31 DE AGOSTO DE 1987.

JORNAL A TARDE SALVADOR, SEGUNDA- FEIRA, 31 DE AGOSTO DE 1987.

A ARTE DE LEONEL MATTOS EVOLUI COM MUITA RAPIDEZ

Dentro em breve o artista Leonel Mattos vai figurar no elenco dos mais festejados artista da nova geração. Sua arte vem dando verdadeiros saltos, queimando etapas, e, para minha satisfação, melhorando em qualidade e conteúdo. Está perdendo aquela influência do folclore, que tanto atrasa alguns artistas, e sua pintura ganha força como pintura, sem a preocupação com uma linguagem narrativa. Não costumo escrever com discurso baseado em citações clássicas ou utilizando uma linguagem “difícil”, porque tenho consciência que escrevo num jornal diário, onde pessoas dos mais variados segmentos da sociedade têm acesso. Por isto, prefiro ver a obra de Leonel Mattos dentro de uma visão ou simbologia onde os passos do artista são acompanhados de perto. Conheço a sua trajetória e sua obstinação em desembarcar em São Paulo acompanhado de sua mulher Rogéria, também artista, para enfrentar a grande metrópole brasileira, sem apresentações ou pistolões- uma vida dura de dedicação à arte. Também por conhecê-lo um pouco, apostava que Leonel sairia vencedor. Agora já começo a sentir alegria do início de sua vitória.
                            Observe a simplificação das formas e a possibilidade da leitura que pode exercitar.
Muitos caminhos ainda vão percorrer, mas tenho certeza que não andará a 20 quilômetros, porque seu talento tem pressa.Lendo uma apresentação do Olívio Tavares de Araújo, vejo que o escrevi anteriormente sobre o artista veio de encontro a este novo texto sobre sua exposição na Chroma Galeria de Arte, localizada na Rua Augusta, em São Paulo.
Diz Olívio que “suas pinceladas estão mais expressivas e mais ricas”. Acrescento que estão mais soltas, mas descompromissadas com a figuração, embora ainda encontremos aquela figura que era um misto de homem e bicho se encontrado. Mesmo aí a uma tendência à simplificação e a repetição desta simbologia nos dá uma noção lúdica de que Leonel está preocupado é com a essência da própria pintura. Isto é um ponto fundamental dentro de sua obra que está inserida dentro da contemporaneidade que hoje desponta em todo o mundo. É difícil prever o que vai acontecer. Mas é fácil saber que Leonel Mattos começa a desvendar o mistério, começa a despontar no horizonte do movimento de arte brasileira disposto a executar o seu talento e seu compromisso com a arte. A leitura às vezes muita discursiva que procura assumir, por exemplo, quando pintou algumas garrafas denunciando a opressão que vivemos, neste País cambaleante do Terceiro Mundo, chega a perder força diante do seu traço, porque ele é livre demais para ficar no discurso. Ele brota espontaneidade, como a vegetação que desaparece na seca, em nosso sofrido sertão, e quando a gente nem espera, está tudo verdejante. Esta é uma força indescritível que explode por força da natureza, que é rico em exemplos muitas vezes até de difícil entendimento.

ROGÉRIA EXPÕE SUAS ESCULTURAS A PARTIR 
DE 3 DE SETEMBRO

Quanto a Rogéria, que também está expondo na Chroma, deixo que Wilson Rocha fale sobre sua obra. Vejamos:“o universo de escultura é inesgotável, como os novos níveis de criatividade numa situação inédita de vigor e originalidade que aporta com as novas culturas de juventude, de onde surgem artistas de surpreendente maturidade e energia criadora, como é o caso da jovem escultora baiana Rogéria Mattos, que traz em seu trabalho a marca profunda de uma aguda sensibilidade voltada para  concepção da escultura enquanto linguagem privilegiada de intervenção espacial. Rogéria concentra-se na essência da própria escultura- essa dinâmica da matéria e da forma, esse ritmo entre volume e espaço aliados ao caráter intuitivo necessário na obra de arte-onde a artista estabelece o diálogo entre a pedra e a linguagem da escultura”.
Rogéria aborda a escultura como um clássico dos nossos dias, com uma vontade artística determinada e consciente que dá vida e energia à forma e dinamismo ao espaço, inscrevendo-se o seu trabalho entre os mais importantes que têm sido feitos nos últimos anos do Brasil no domínio da escultura em pedra. O comportamento e o tratamento da matéria sem detrimento dos valores expressivos e sígnicos; o envolvimento, o fascínio, a riqueza e a penetrabilidade das superfícies volumétricas, os flancos graciosos de suas pedras, a textura magnífica, a suave frescura de pigmentação dos seus granitos e mármores, no caso, encontram um artista capaz de lhes dar expressão na sensibilidade e integridade desta vigorosa e apaixonante escultora. O respeito pela pureza dos meios utilizados por artistas como ela não é, evidentemente, uma novidade. Esse respeito surgiu em todos os momentos da modernidade.

          SESSENTA MÁSCARAS DE LECUMBERRI

Quando esculpe rostos e máscaras a partir de materiais como o couro, o artista plástico argentino Lecumberri Villanueva busca muito mais que o simples registro de feições recolhidas em suas andanças pela vida.“Interessa-me refletir a alma das pessoas através dos seus gestos”, diz ele, quando lhe pedem para explicar seus trabalhos, que estarão, de 2 a 14 de setembro, acessíveis à sensibilidade do público baiano na exposição Nos Rostos das Máscaras.
São cerca de 60 peças confeccionadas em couro e tecido endurecido cuja vertente comum é o teatro, primeira paixão do autor.
Lecumberri Villanueva está há dois meses na Bahia, cuja presença é possível sentir nos seus últimos trabalhos, a exemplo da enigmática Iemanjá que ele fez surgir de uma lâmina de couro azul. Nascido em Buenos Aires, há 31 anos, o artista atuou em várias peças teatrais dedicando-se também à pintura e á fotografia durante algum tempo, o que levou a visitar Paris, Roma e outras cidades da Europa. Sua arte é uma mescla de todas essas experiências e, conforme ele próprio esclarece, não objetiva senão refletir emoções.
Nos rostos das Máscaras tem a participação do grupo de teatro Sintesis e a produção de Zoca, artista responsável pela vinda de Lecumberri a Salvador. Sua próxima mostra já está marcada para o dia 26 de outubro (até 11 de novembro), no Solar do Unhão, seguindo depois para Brasília (Ronaldo de Oliveira).